O ouriço azul está de regresso numa aventura suficientemente sólida, mas com cheiro a naftalina.
Chego tarde à festa. Por esta altura, a maioria dos sites internacionais e nacionais já analisaram Sonic Colors Ultimate nas mais variadas plataformas e o consenso parece apontar para uma remasterização desequilibrada, repleta de problemas técnicos, mas envolta num videojogo que resistiu ao teste do tempo. E assim parecia ser a história de Sonic Colors, um unicórnio na famosa série da SEGA, enclausurado no catálogo já poeirento da Nintendo Wii e sem um escape – até agora.
Mas temia o pior. A estreia de Sonic Colors no PC e nas consolas da atual geração parecia ser marcada por uma versão quase intragável do que parecia ser um clássico moderno, mas aproveitei a minha deliciosa vantagem, amavelmente proporcionada pelas distribuidoras nacionais – no sentido em que decidiram enviar um código para análise já quando o jogo se encontra nas lojas –, para analisar a fundo o que parecia ser uma má conversão, feita à pressa e com a pressão tradicional da SEGA. O que encontrei foi muito mais do que isso: uma desilusão.
Não sou fã de Sonic Colors. Não estou a falar da versão remasterizada, que, devo sublinhar, comportou-se perfeitamente bem na PlayStation 5 (em modo retrocompatibilidade) – demonstrando gráficos mais cuidados, coloridos e um desempenho sólido, salvo a qualidade arcaica dos vídeos em 480p –, mas sim do videojogo em si. Sonic Colors comporta-se como um meio-termo entre Sonic Unleashed, sem as sequências de noite, e o que viria a ser a jogabilidade mais intuitiva e limada de Sonic Generations, apostando unicamente em Sonic como protagonista e utilizando as habilidades que viriam a ser estandartes das suas aventuras em 3D, como o deslize rápido e um boost impiedoso e nem sempre fácil de controlar.
Os níveis seguem uma estrutura próxima aos títulos acima mencionados e dividem-se entre sequências 3D, focadas na velocidade, e em momentos plataformas, mais ponderados e em 2D, construindo uma campanha que nos pede que sejamos tão destemidos, como cuidadosos perante alguns dos desafios que encontramos. No papel, Sonic Colors parece funcionar tal como qualquer outro título da série em 3D, para o bem e para o mal, mas algo parece falhar neste antigo exclusivo da Wii. Não descarto o gosto pessoal da equação, pois posso ter entrado nesta aventura com uma enorme e desmedida antecipação que me azedou a experiência, mas senti que o design dos níveis, em especial das primeiras zonas, não é tão entusiasmante ou equilibrado como nos títulos lançados depois de Colors.
Esta perceção levou-me numa batalha interior durante as primeiras horas, incrédulo com a conclusão a que estava a chegar. Para todos os efeitos, a campanha de Colors é uma das mais completas e extensas da série, oferecendo sete zonas, divididas por seis atos e uma batalha de boss, e ainda um enorme incentivo à repetição de cada nível através da descoberta das famosas moedas vermelhas e os Park Tokens, uma das novidades da remasterização, que permitem a compra de itens cosméticos.
Com esta aposta no conteúdo, Colors parece aproximar-se mais de um jogo de aventura do que da estrutura rápida e cirúrgica dos originais, mas quanto mais jogamos, mais percebemos que a ilusão se dissipa. Na verdade, os níveis são curtos, alguns não duram mais do que um minuto e assumem-se como descartáveis numa campanha que devia ter sido curada pela equipa. Num momento, sentimos que estamos a jogar alguns dos melhores níveis da série, enquanto que noutros somos recebidos por níveis curtos, sem sabor ou intensidade, que servem apenas para expandir artificialmente a campanha do jogo.
Estou a ser duro com Colors, mas é frustrante pensar sobre a campanha e perceber que merecia uma redução de conteúdos para construir uma experiência muito mais sólida e satisfatória do que aquela que recebemos. 11 anos depois, estes problemas tornam-se ainda mais claros, mesmo com as melhorias nos controlos e a implementação de novos conteúdos – como o novo Wisp e o modo Rival Rush –, quando encontramos uma remasterização que parece ter denegrido ainda mais a sua reputação. Não falo do desempenho ou da quantidade absurda de bugs que alguns jogadores encontraram durante a campanha, especialmente na Nintendo Switch, mas sim numa falta de impacto nos controlos e na banda sonora. Não sentimos a velocidade, os movimentos ou ataques de Sonic, e as composições parecem perder-se dentro da confusão controlada dos níveis e nunca sobressair. Há uma falta de feedback que, infelizmente, não consigo determinar se já estava presente na versão original ou se foi uma consequência da passagem para a alta definição.
O meu desapontamento, depois de 11 anos de espera, culminou na implementação dos Wisps, os adoráveis extraterrestres que auxiliam Sonic na sua batalha contra Eggman (ou Dr. Robotnik). Espalhados pelos níveis, os Wisps desbloqueiam novos poderes e habilidades que Sonic poderá utilizar por tempo limitado, desde uma maior velocidade até à possibilidade de ultrapassar barreiras (como um fantasma), lançar-se no ar como um foguetão, perfurar o chão ou subir plataformas como um verdadeiro ouriço de metal. As habilidades combinam perfeitamente entre níveis e servem de incentivo para voltarmos às zonas anteriores para desbloquearmos novos caminhos e encontrar as moedas vermelhas que nos escaparam, mas vi-me muitas vezes a questionar a sua utilização realística dentro das várias fases. É assim tão necessário utilizar um poder que nos lança no ar, em linha reta, para avançarmos no nível? E que desafios reais apresenta a broca para além de podermos morrer sufocados? O que adicionam, no fim, estes poderes além de encontrarmos os colecionáveis escondidos?
Para justificar a sua presença no jogo e a sua utilização nos vários níveis, a Sonic Team parece ter alargado a escala dos níveis, especialmente a nível vertical, para combinar as várias habilidades num só espaço. Infelizmente, esta aposta não dá origem a níveis mais desafiantes ou inventivos, mas, tal como a extensão desmedida da campanha, a espaços mais vazios. E esta ausência de desafio afastou-me progressivamente de Sonic Colors, tornou-o cansativo e sem grande impacto. A presença dos Wisps não adiciona muito à fórmula da série, apesar de ser o foco do jogo, e isso cria uma dissonância estranha, mas incontornável. E é aqui que entra a questão do gosto pessoal. Apesar das minhas críticas, os Wisps podem funcionar para vocês e eu respeito isso. Para mim, descentralizaram a jogabilidade ao obrigar o jogo a equilibrar um novo elemento que só é utilizado em momentos muito específicos e que não combinam com aquilo que considero ser o centro da experiência da série: a velocidade e a aposta em sequência mais tensas de plataformas.
Nunca consegui jogar Sonic Colors na Nintendo Wii e sinto que perdi algo. Como fã da série, este capítulo na saga representava, há 11 anos, um foco e uma determinação que não via nos títulos principais, como o já mencionado Sonic Unleashed. À distância, Sonic Colors parecia ser a experiência que procurava e acredito que fosse, mas uma década passou e já não consigo encontrar a aventura que necessitava. O humor é refrescante, naquele que viria a ser – por mera especulação – o início do humor depreciativo e consciente da série, que ainda hoje está presente, algumas zonas são coloridas e diferentes de tudo o que já vimos em títulos antes e depois de Colors, e a jogabilidade é suficientemente agradável para perdermos horas com a campanha. Mas falta algo. Falta algo num jogo repleto de conteúdos e opções de personalização. Há um vazio incontornável. São as rugas do tempo.
Cópia para análise (PlayStation) cedida pela Ecoplay