Paradise Killer – Um Crime no Expresso Vaporwave

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Uma história de crime num mundo de deuses onde a nostalgia e a crítica andam de mãos dadas.

O Conselho foi assassinado. O crime aconteceu na noite anterior, a portas fechadas, durante o fim da ilha Paradise 24. O suspeito foi apanhado e enclausurado. As provas parecem ser unânimes e tudo indica que ele é o culpado pelo assassinato, mas algo não faz sentido. Como poderá um mero mortal ter entrado na sede do Conselho e assassinado as figuras mais importantes de Paradise? Será que alguém o auxiliou neste crime hediondo? E será que os membros do Conselho estão definitivamente mortos, já que ninguém tem autorização para entrar no local do crime? É perante estas dúvidas que Lady Love Dies é chamada para a ilha de Paradise, 3 milhões de dias depois do seu exílio e a sua missão é simples: descobrir o que se passou na noite anterior.

Paradise Killer constrói-se entre o real e o divino, transportando-nos para um mundo onde deuses, demónios e humanos convivem numa busca pela perfeição. A ilha de Paradise é o palco para este jogo de investigação em formato de mundo aberto. Numa realidade onde os deuses estão mortos, Paradise é um enorme exercício metafísico sobre fé e consumismo, com os habitantes da ilha em busca de um mundo perfeito, mas também de respostas. A cada milénio, a ilha é reconstruida do zero, cada vez mais próxima do ideal pretendido e é aqui que encontramos os protagonistas de Paradise Killer – a um passo da perfeição. Com o assassinato do Conselho, este processo não pode ser finalizado e somos levados a questionar a sua importância para este leque de personagens extravagantes e coloridas, onde nada é o que parece.

Como Lady Love Dies, a nossa irreverente investigadora, temos a ilha de Paradise para explorar enquanto reunimos provas e falamos com os principais suspeitos. Ninguém é totalmente inocente em Paradise e todos têm os seus segredos e interesses entre deuses, demónios e homens, e é necessário perceber as motivações e segredos destes seres maiores que a vida. Paradise é enorme e aberta à exploração desde o primeiro minuto, algo surpreendente para este estilo de jogo. Depois de uma breve introdução, onde conhecemos melhor Starlight, o nosso fiel computador e companheiro – que podemos utilizar como base de dados e ferramenta para a resolução de puzzles -, somos atirados para a ilha e livres de explorar como e quando quisermos. A ilha apresenta várias zonas distintas, que podemos aceder via “fast travel”, onde os limites são quase inexistentes. Há muito para conhecer em Paradise e muitos dos mistérios e pistas secundárias só são acessíveis se se deixarem perder pela exploração e pelo reconhecimento deste mundo banhado em saudosismo e ironia, não fosse o Vaporwave uma das suas inspirações estilísticas.

Parte jogo de exploração na primeira pessoa, parte jogo narrativo, Paradise Killer surpreende na forma como interliga os vários casos e personagens através da investigação. Cada suspeito tem várias opções de diálogo e uma história pessoal que poderemos conhecer ao longo da campanha, com cada pista a abrir novas possibilidades neste enorme jogo de sombras. Encontrei momentos em que uma simples peça, como um capacete perdido, abriu inúmeras possibilidades para a investigação, permitindo-me conhecer melhor não só o mundo de Paradise Killer, mas também os seus protagonistas. Apesar da sua liberdade, tudo está ligado, pensado e estruturado de forma a contar mais sobre o mundo através da narrativa e dos puzzles. E apesar de termos alguns indicadores visuais, como a localização dos suspeitos principais, a liberdade é extasiante no sentido em que vemos as peças lentamente a combinarem entre si e o estranho a transformar-se em familiar. Sem o mundo aberto, isto não aconteceria, não a este nível e é isso que torna Paradise Killer tão intimidante, como fascinante: a sua aposta na escrita e num sistema de investigação que não leva o jogador desnecessariamente pela mão, permitindo que explore, que erre e se perca para depois recompensar a sua curiosidade.

Infelizmente, esta liberdade tem repercussões negativas sobre a estrutura e o ritmo de Paradise Killer. Se, por um lado, temos esta possibilidade de explorarmos a ilha sem restrições, onde encontramos novas pistas e casos secundários, por outro, deparamo-nos com um cenário demasiado vazio para o seu tamanho. Adoro o estilo visual, esta aproximação aos 1980, mas sob uma visão mais cínica e crítica, com a banda sonora a deliciar-se também pelo Vaporwave e as melodias familiares, mas nunca claras. Este detalhe visual, que surge agora mais definido e com novas opções de desempenho – graças à versão para a nova geração de consolas -, é delicioso, mas não o suficiente para dar vida a zonas vazias, sem personagens ou objetivos mais interessantes. Paradise Killer justifica esta ausência de personagens através da narrativa, mas não é o suficiente para desculpar os trechos de praia, jardins e apartamentos idênticos que servem apenas para esconder as centenas de colecionáveis que podemos encontrar na ilha. É um caso estranho onde o melhor elemento do jogo é também aquele que mais o prejudica a longo prazo, eliminando parte da diversão de nos embrenhar-nos na investigação em si.

Paradise Killer jorra charme e aprecio a forma como interliga o seu conceito de investigação com elementos de visual novel, criando uma narrativa tão interessa em desenvolver o seu mundo, como as suas personagens. Os puzzles não são muito desafiantes, mas é delicioso ver as peças a encaixarem à medida que encontramos novas pistas e desafiamos o status quo deste mundo entre realidades. Faltou-lhe uma maior curadoria na exploração e no design da ilha, tal como um maior risco nas escolhas narrativas e no seu impacto na história. No entanto, Paradise Killer é um jogo curioso e muito forte a nível visual que, quer gostem ou não, será incapaz de vos deixar indiferentes.

Recomendado

Cópia para análise (versão PlayStation 5) cedida pela DoubleJump.

João Canelo
João Canelo
Crítico de videojogos, Guionista, Professor e o responsável pelo melhor mortal nas aulas de Educação Física em 2002. Um aficionado por jogos peculiares.
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