Kena: Bridge of Spirits – Quando os visuais não salvam um jogo da repetição e deceção

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A soma das suas partes faz de Kena um jogo sólido, mas ignorando a sua bela apresentação, encontramos um produto redundante, chato e na maioria das vezes insatisfatório.

As altas expectativas podem ser perigosas. Quando a antecipação por um novo lançamento acontece com um jogo a responder às nossas expectativas, tal é extremamente satisfatório, mas quando algo falha, mesmo que seja pouco, ficamos com um sabor amargo e estamos sujeitos a criar uma bola de neve de irritabilidades pessoais em cima do que não funciona. E foi exatamente isso que aconteceu com a estreia da Ember Lab no mundo dos videojogos com Kena: Bridge of Spirits.

É inegável o facto de cairmos rapidamente de amores por Kena: Bridge of Spirits. Aconteceu assim que o título foi anunciado para as plataformas da PlayStation, com incríveis cinemáticas aparentemente in-engine, muito pelo primeiro contacto com o jogo que nos dá uma enorme vontade de explorar cada canto dos seus belos ambientes, ainda que não atinja a qualidade e consistência visual prometida.

Se há bons elogios a fazer a Kena: Bridge of Spirits é, sem dúvida, a nível de apresentação. Seja de som ou visual e de animação, é uma afirmação do talento da equipa da Ember Lab, que anteriormente era um estúdio de animação, com um portfólio onde se encontram, por exemplo, trabalhos produzidos para marcas como a Hisense ou Coca-Cola, ou projetos como o fan-film Majora’s Mask – Terrible Fate, inspirado no universo de The Legend of Zelda.

Não há dúvidas do talento empregue em Kena: Bridge of Spirits e está claro nas suas cinemáticas pré-renderizadas: nas que correm com o motor de jogo, na direção das cenas, nas animações das personagens, no design do mundo e personagens e, também, na incrível música que acompanha os momentos mais importantes.

Tudo isto correspondeu, de facto, ao que esperava do jogo antes de lhe meter as mãos. No entanto, tudo o resto que o jogo ofereceu desapontou-me com nitpicks pessoais a transformarem-se em irritações constantes devido à forma como todos os seus elementos colam.

É um projeto de médias produções de um estúdio independente e tenho isso bem presente, mas esperava uma aventura um pouco mais aliciante e não tão genérica, que vive simplesmente com o suporte das suas cinemáticas, fazendo com que tudo o que acontece pelo meio – a exploração e o combate – exista apenas para encher o pacote de alguma forma.

Kena é uma jovem guia de espíritos e, nesta aventura, vamos libertando um mundo destruído por uma entidade negra ao salvar e libertar espíritos de personagens importantes neste mundo, que servem de bosses das várias armas do mapa. É uma premissa simples que serve de fio condutor para a nossa jornada relativamente linear.

Apesar do charme da personagem que dá o nome ao jogo, ao longo da nossa aventura não sabemos muito sobre a mesma, salvo por raros flashbacks, com tudo a girar apenas à volta dos espíritos, sendo essa apenas a nossa única ou principal força motora para avançar na história.

Removendo a parte narrativa que pouco me prendeu (e que poderia ser o maior aspeto redentor do jogo), uma vez que vem de um estúdio anteriormente dedicado ao “storytelling”, ainda que através de pequenos projetos, os restantes pilares que suportam o jogo também fizeram pouco para me convencer. Refiro-me, obviamente, ao combate, progressão, exploração e resolução de puzzles.

Não me interpretem mal antes de continuar a minha opinião. Na soma das suas partes, Kena: Bridge of Spirits é um jogo bastante competente, mas a forma como os diferentes elementos são aplicados no jogo deixa sempre um pouco a desejar. Um desses exemplos é a navegação pelo mundo e florestas de Kena: Bridge of Spirits. Este é um título altamente inspirado em clássicos 3D da era da PlayStation 2 ou Nintendo 64, com um level design sólido, com espaço para exploração, que nos dá a ilusão de abertura do mundo através de áreas interligadas com segredos escondidos e múltiplos objetivos para cumprir antes de avançar para o nível seguinte. Portanto, tudo coisas básicas e normais… não fossem as nossas ações tão repetidas e simplórias, ou os puzzles de ambiente tão frustrantes de ler/encontrar apesar das resoluções muito simples.

Mecanicamente, é um jogo de ação na terceira pessoa onde temos um bastão, que eventualmente se transforma em arco para lançar flechas, e como habilidade especial temos um conjunto de criaturas que podem transformar-se numa pequena entidade para resolver certos problemas ou atacar inimigos. Apesar dessas adoráveis criaturas chamadas Rot estarem sempre presentes e serem importantes para o jogo, a sua aplicação é simples e, na maioria dos casos, desnecessária, servindo apenas como mais uma barreira ou justificação para a resolução de um puzzle ambiental de abertura de portas e caminhos.

Foram vários os momentos em que olhava para o mapa, via os vários elementos a usar para a resolução de um desafio, sabia a sua resolução, mas não encontrava um ponto de partida. Fosse por falta de indicadores ou por cristais escondidos naquela zona. O mesmo aconteceu frequentemente com caminhos escondidos, que me fizeram andar à volta ao ponto de, sem querer, ao tentar atalhar, andar demasiado para trás nos mapas. Momentos como estes são pequenos exemplos que me fizeram sentir com tempo perdido durante a exploração.

A falta de vontade de avançar contribuiu para também não apreciar a jogabilidade do jogo e encontrar um enorme desequilíbrio no combate e até na identidade de um título que podia ser bem mais divertido se fosse mais acessível. O combate é relativamente simples e fluido, com ataques rápidos, ataques fortes, ataques à distância, uso do Rot, etc… ataques que podem ser melhorados numa árvore de habilidades. Mais uma vez, tudo normal.

Ataque, desvios, defesa e contra-ataque fazem um loop de jogabilidade que se torna rapidamente repetitivo e insatisfatório. Kena: Bridge of Spirits comete o pecado capital de abusar de minions em combates com bosses, retirando as nossas atenções na ameaça principal estendendo o tempo do combate, o que é extremamente stressante quando a barra de vida é extremamente limitada (mesmo atualizada), quando temos poucas oportunidades de recuperar vida durante os combates e quando os inimigos apresentam padrões de ataque com energias desequilibradas. Um ataque tão depressa nos mata de uma vez, como causa pouco dano sem razão aparente. Ou apresenta sequências de dois ataques, três ou quatro, sem dar sinal, seja no modo mais fácil do jogo ou no mais difícil. Em cima disso, o sistema de defesa é também imperfeito, com uma janela de ativação extremamente pequena, alimentando assim o sentimento de combate insatisfatório.

Claro que tudo isto é muito pessoal, pelo menos este sentimento de afastamento ao jogo, que para outros jogadores pode não ficar tão presente. Mas mesmo com a soma das suas partes a resultar num jogo cheio de charme e bem produzido, com o coração no sítio certo e influências deliciosas de outras eras, a verdade é que o meu tempo com Kena: Bridge of Spirits, que poderia ser uma aventura emocional por um belo mundo verdejante com adoráveis personagens, acabou por se tornar numa série de tarefas insatisfatórias que fizeram evaporar o escapismo que procurava neste projeto.

Kena: Bridge of Spirits pode ser jogado no PC, PlayStation 4 e PlayStation 5.

Cópia para análise (PlayStation) cedida pela Ember Lab.

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