Adriana Calcanhotto no CCB – A Mulher do Pau Brasil

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Do outro lado do atlântico chegam-nos sons e ritmos quentes, pautados pela leveza de quem vive uma vida livre. Adriana Calcanhotto é um exemplo vivo disto, tendo conquistado o seu público irmão com a sua voz de timbre caloroso e suave, com as suas obras musicais que nos embalam e as letras que nos deixam um quentinho no coração, que nos fazem sorrir, numa onda “bossa nova pop” muito própria.

A sua carreira teve início nos anos 90, mas o espetáculo que deu em Lisboa, mais precisamente no Centro Cultural de Belém, no passado dia 10 de Abril, foi uma estreia. “A Mulher do Pau Brasil”, designação dada a este espetáculo inédito, nasce do seu trabalho enquanto Embaixadora da Universidade de Coimbra e de toda uma carreira que reflete e se debruça sobre literatura e história. Porque para além de artista, Adriana é claramente uma mulher de palavras, compreendendo e utilizando o seu poder transformativo e aliando-o à música.

A expetativa e curiosidade eram, assim, de elevado nível. Todo um público sedento por um concerto que prometia muito formou uma fila gigantesca que não só encheu, como quase transbordou, o Grande Auditório.

Envolta num ambiente misterioso e provocativo, a artista surge balanceando-se numa cama de rede enorme suspensa sob o palco, acompanhada por Gabriel Muzak, na guitarra, e Ricardo Dias Gomes, no piano e baixo. “Mulher do Pau Brasil” foi, justamente, o tema de abertura, homónimo do espetáculo – esta audiência teve o privilégio de escutá-lo em primeira mão –, inspirado nos movimentos modernista e antropófago brasileiros dos anos 20, cujo título é inspirado na obra Pau Brasil, de autoria do poeta Oswald de Andrade, editado em 1925.

Em entrevista, Adriana afirmou que o seu principal foco para este espetáculo seriam a dor, o luto e a luta. E é isso mesmo que transmitem estes dois primeiros temas, tanto “A Mulher do Pau Brasil” quanto a se seguiria, “A Dor Tem Algo de Vazio” – poema de Emily Dickinson, com título homónimo. É verdadeiramente incrível o quão bem consegue a artista transpor três temas tão complexos da vida em notas musicais. A forma intensa e quase desesperada com que canta a frase “de dor”, no refrão, não deixa nada por dizer.

Mas nem só de temas novos se formou esta noite. Adriana prestou homenagens a alguns outros cantores conhecidos, tais como Maria Bethânia – com o tema “Mortal Loucura” –, Vinicius de Moraes – com o tema “Nature Boy” – e Chico Buarque – com o tema “Caravanas”. De entre as melodias mais conhecidas, tivemos o prazer de voltar a ouvir clássicos como “Esquadros”, “Onde Andarás”, “Não Demora”, “Inverno”, “Devolva-me” e as tão conhecidas “Vambora” e “Fico Assim”. Nomes grandiosos, músicos de excelência e temas clássicos que enriqueceram muito a experiência e, decerto, provocaram muita nostalgia.

Chega com calma o tema “Noite de São João” – poema do heterónimo Alberto Caeiro proclamado por Adriana Calcanhotto -, o que só tornou a noite ainda mais mágica e poética.

Está aberto o caminho para mais um novo tema, “O Que Me Cabe”. Acompanhada de uma guitarra pautada ao ritmo bossa nova, e com um timbre de voz aveludado, Adriana embala-nos ao som de uma letra sofrida, na qual, novamente, o tema da dor está muito presente, como se deixa entender, de resto, pela letra: “Você não sabe, o que me cabe. No silêncio, dor. No escuro, dor. No espelho, dor.”

De igual modo, nem só de música se fez este concerto, na medida em que houve longos e saborosos momentos de diálogo entre a artista e a plateia, criando um ambiente empático e envolvente. Foram diversos os momentos ao longo do espetáculo que Adriana partilhou histórias e inspirações, provocando emoções fortes entre o público, e arrancando algumas gargalhadas.

Terminou esta noite sublime com um encore muito especial. “Tigresa” (original de Caetano Veloso) e “Fico Assim” foram os dois temas escolhidos pela artista para se despedir. De notar um precalço que decorreu em plena canção “Fico Assim”: um simples erro por parte de um dos músicos despertou toda uma onda de riso na plateia. Adriana soube lidar com este momento com muita naturalidade e leveza, novamente interagindo com o público com humor, acabando assim por ser um momento que fez toda a diferença! Adriana prometia e, definitivamente, não desiludiu.

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