Sem VR, Alien: Rogue Incursion é uma experiência mais previsível, com poucos picos de intensidade e terror, ainda que seja maioritariamente sólido na sua adaptação
A realidade virtual é o meu Santo Graal. É o meu oásis num deserto profundo, o templo perdido que nunca irei desbravar ou o planeta que nunca nomearei. Esta é a última fronteira dos videojogos que se manterá inacessível porque sofro de motion sickness. Esta condição está a piorar com os anos, fruto da idade e do tempo. Não consigo ler nas camionetas, os parques de diversão são roletas russas de movimento, às vezes baixar a cabeça e erguer-me de súbito atira-me ao tapete. O mesmo acontece nos videojogos, especialmente na primeira pessoa, onde o arrasto da imagem, a câmara que treme, os movimentos irregulares da personagem ou dos pontos de foco deixam-me enjoado e incapacitado durante horas. A realidade virtual agiganta esta condição, fecha-me a um espaço ainda mais limitado, onde o meu ouvido interno e o meu cérebro disputam se estou ou não em movimento. Eu consigo ver o futuro, mas sempre que me aproximo, a câmara move-se e eu tenho de me deitar.
O anúncio de Alien: Rogue Incursion foi uma montanha russa de emoções. A expectativa de termos um novo jogo de ação na primeira pessoa no universo Alien, 10 anos depois de Alien Isolation, era exatamente o que eu queria. Depois de vários jogos da saga, a solo ou à batatada com Predators, as opções foram escasseando. Aliens: Colonial Marines foi um desastre absoluto, Aliens vs Predator (2010) não captou a atenção dos jogadores e Alien Isolation é um blip perfeito num futuro incerto que só agora tem confirmada a tão aguardada sequela. Existia uma escassez e Alien: Rogue Incursion parecia ser a solução, até que fui assombrado pela revelação que temia: era um jogo VR. O sonho fugiu-me. A motion sickness, o valor avultado dos óculos de VR, a incapacidade para renovar o PC ou apostar no periférico para a PlayStation 5 colocaram o título da Survios no reino da impossibilidade.
A receção não foi propriamente calorosa, mas Alien: Rogue Incursion também não foi um verdadeiro flop. O potencial estava presente nesta aventura VR, daquelas ideias que fazem tanto sentido que ficamos admirados por não terem acontecido antes. A possibilidade de visitarmos o universo de xenomorphs e Engineers, e explorarmos as estações ou bases da Weyland-Yutani, é uma proposta perfeita para a realidade virtual. No entanto, esta aposta é também um risco. O formato VR ainda é um entrave, uma mera curiosidade num hobby progressivamente mais caro e se existe um público extenso para a saga Alien, certamente esse público não está tão disponível quando existe a exigência de óculos VR. Então a Survios fez uma decisão arrojada, adaptar Rogue Incursion a um jogo de ação na primeira pessoa sem o auxílio do VR, um modelo mais tradicional e de género, sem grandes artifícios. Um ano depois, Alien: Rogue Incursion – Part I: Evolved Edition procura encontrar os fãs perdidos, agora num formato mais familiar, mas com resultados nem sempre eficazes.
A viagem de Zula Hendricks e o androide Davis 01 foi pensada para VR e a Survios não escondeu propriamente a origem nesta adaptação. A perspetiva na primeira pessoa continua a assemelhar-se a uma angular, como se todos os objetos e personagens ficassem mais presentes e agigantados no ecrã para facilitar a sua leitura. Existe uma enorme rigidez em campo, onde personagens e xenomorphs movem-se com uma lentidão propositada, cuja coreografia serve a jogabilidade e perspetiva VR com grande sucesso, mas que aqui se torna mais estranho do que funcional. As ações coreografas são ainda mais óbvias em combate, com os xenomorphs a pararem, a realçarem os seus movimentos e ataques para que tenhamos tempo de resposta. Com um comando, longe de óculos e periféricos adicionais, esta lentidão pode ser corrigida através dos modos de dificuldade, mas nunca desaparece. Em normal, Rogue Incursion é demasiado fácil e acessível devido a esta incapacidade em corrigir o que era anteriormente uma funcionalidade de destaque.
O mesmo pode ser dito da forma como interagimos com o mundo de Rogue Incursion. Se a exploração ficou mais fluída e fácil de navegar, muito devido à liberdade de controlos e movimentos, a tensão perdeu a sua eficácia. Este é um sacrifício impossível de evitar. Se o VR nos coloca no centro da ação, onde o nosso corpo tem presença dentro do mundo do jogo, o medo e a inquietação ganham uma nova dimensão porque sentimos que estamos no interior da estação enquanto somos rodeados e atacados por xenomorphs. Com um comando e a televisão, cria-se uma distância. Para a tensão manter-se eficaz, a Survios precisava reequilibrar a jogabilidade e a IA dos inimigos ao ponto de perdermos a confiança que este distanciamento psicológico e físico nos proporciona – tal como Alien Isolation e até Amnesia: The Bunker fazem. Esta é uma conversão de sacrifícios, onde ganhamos uma maior liberdade de movimentos e uma segurança forte na forma como atacamos e exploramos, mas perdemos todo o terror que estava presente na versão original.
Esta adaptação cumpre a sua missão sem grandes surpresas, mas é possível sentir o potencial perdido. O facto de nunca sentirmos que abandonamos a versão original é um dos maiores problemas de Rogue Incursion, ao ponto de prejudicar a campanha a longo prazo. Apesar dos esforços da Survious, sentimos que a jogabilidade é menos variada e tátil do que seria em VR. A forma como interagimos com as portas, painéis e puzzles retém as mecânicas originais, só que agora transportas de ações por movimento para a utilização de um botão do comando. A nova versão torna-se mais previsível, menos tensa e estamos constantemente a ver o fantasma de algo melhor e mais profundo. As boas ideias continuam presentes, a utilização do sensor de movimentos é eficaz, as armas respondem perfeitamente e a mira é aceitável. A Survios conseguiu um meio-termo aceitável, funcional, sem grandes surpresas, mas fico a ponderar sobre como seria esta série – cuja Parte 2 ainda se encontra em desenvolvimento – se fosse adaptada de raiz a um ambiente fora do VR.
Cópia para análise (versão PlayStation 5) cedida pela Survios.