Apesar das suas boas ideias, a execução peca em encontrar um equilíbrio entre a exploração, o combate e as mecânicas de sobrevivência.
A minha primeira hora com Mists of Noyah foi mergulhada em confusão, talvez por culpa minha, mas certamente motivada pela ausência de contexto e uma melhor introdução às inúmeras mecânicas e sistemas presentes na jogabilidade. No papel, Mists of Noyah é um RPG de ação sidescroller, onde a exploração e mecânicas do género conciliam-se com uma estrutura mais próxima aos títulos de sobrevivência e gestão. Durante o dia, nós podemos explorar o mundo e descobrir os seus vários biomas enquanto enfrentamos criaturas e recolhemos recursos que nos permitem criar novos itens, equipamentos e até expandir as lojas e habitações da nossa aldeia. Durante a noite, Mists of Noyah transforma-se num jogo de sobrevivência, onde somos perseguidos por hordas de monstros enraivecidos, condicionando a exploração e aumentando consideravelmente a dificuldade. Pelo menos, é o que eu acho que Mists of Noyah procura ser.
A sua combinação entre exploração e sobrevivência é peculiar, mas mais desequilibrada e confusa do que deveria ser. Se a evolução da personagem segue os moldes tradicionais do género, onde cada combate traduz-se a novos pontos de experiência que aumentam os atributos e disponibilizam pontos que podemos alocar numa árvore de habilidades, já a exploração é mais condicionada pela necessidade de recolhermos recursos para criarmos melhores armas e desbloquearmos novas opções na aldeia. Este é o ponto de partida, mas rapidamente compreendemos que existe um problema nesta abordagem e na forma como Mists of Noyah recusa-se a contextualizar a sua jogabilidade. Uma decisão que, acredito, surja da intenção da equipa em injetar algum desafio ao obrigar os jogadores a compreenderem as mecânicas por si, mas tal escolha só funcionaria se estivesse equilibrada. Do que vale desafiar o jogador se as mecânicas não são interessantes e se há tão pouco para compreender? O que temos é um jogo sem identidade que nunca consegue comunicar-nos o que quer fazer e qual é a sua abordagem.
A campanha começa com a escolha de uma personagem e na criação do mundo que teremos à nossa disposição. Assim que terminamos o processo de criação, somos atirados para o que parece ser a zona de tutorial de Mists of Noyah, sem mais informações ou detalhes sobre o que podemos ou devemos fazer neste mundo de fantasia. Então exploramos e compreendemos melhor os controlos, como o seu duplo salto e desvio, tal como o sistema de combate simplificado e sem feedback que nunca é percetível – na verdade, vemos números no ecrã que representam o dano provocado, mas não compreendemos o seu propósito, o que simbolizam e o que estamos a fazer até que nós ou os inimigos são derrotados. Encontramos árvores, rochas e plantas espalhadas pelos cenários, mas não compreendemos se devemos interagir com estes objetos ou se temos de esperar. Noutro jogo de sobrevivência, o símbolo de “cortar” e “partir” representam o tipo de ferramentas que devemos construir para ter acesso a recursos como madeira e minerais. Em Mists of Noyah, não existe essa preocupação, mas o jogo não nos comunica que podemos começar a recolher recursos. É estranho.
Quando chegamos à aldeia, que serve como hub, a campanha começa e temos à disposição ferreiros, mercadores, vendedores, vários tipos de lojas e até a possibilidade de plantar, cozinhar e construir novos edifícios. No entanto, Mists of Noyah não introduz estes sistemas e deixa-nos sem opções para interagir com aquilo que deveria ser a sua alma: melhorar a aldeia e preparar os ataques dos monstros. Então temos espaços vazios, vendedores e lojas que não só não servem para muito durante a primeira hora de jogabilidade, como não compreendemos sequer como funcionam e o que precisamos de fazer para as desbloquear. Cheguei a uma das zonas mais avançadas, já depois do mundo de gelo, e voltei à aldeia para descobrir que nada mudou. Terei de avançar mais? E até onde deverei avançar até poder interagir com os sistemas interessantes? Não é um problema de timing, antes de propósito.
Se o combate e a exploração fossem mais empolgantes, penso que existiria maior motivação para compreender os sistemas de Mists of Noyah. Infelizmente, o combate não tem peso, os inimigos não são inteligentes ou desafiantes no que toca aos seus padrões e habilidades – é tudo uma questão de números e níveis, pouco mais, sem alterações nos seus comportamentos –, e as nossas opções não são suficientemente variadas para adicionar alguma substância aos confrontos. As combinações são muito idênticas, não requerem qualquer memorização ou utilização de comandos com timing, e as habilidades estão demasiado dependentes de MP para serem viáveis. O que também não ajuda é a experiência ganha em combate, que peca em comparação com os pontos que recebemos ao realizarmos tarefas mundanas. Quando um inimigo derrotado dá menos pontos de experiência do que pescar ou construir equipamentos, o combate passa a ser ainda mais descartável do que já é. Para ajudar, existem alguns bugs chatos que condicionam a utilização de ataques sempre que ativamos o menu em ação.
O mundo de Mists of Noyah está dividido por biomas, mas as zonas são muito curtas e pouco convidativas à exploração. Fora os recursos e o ocasional baú, não existem grandes motivos para percorrermos todas as zonas. Também não existe uma ligação lógica entre elas e rapidamente passamos de bioma sem percebermos porquê ou com que finalidade. Existe uma certa aleatoriedade no seu desenho e isso é notório na forma como as plataformas surgem sem oferecerem grandes oportunidades de combate ou exploração. Como os inimigos estão constantemente a fazer respawn, falta coesão e ordem no mundo de Mists of Noyah para se criarem situações de tensão ou desafio. Fora as barreiras impostas pelo nível dos inimigos, cujo poder de ataque é irregular, podemos simplesmente avançar até aos pontos de recolha de recursos e ignorar grande parte dos cenários. Ou então, podemos ignorar tudo e procurar a saída de cada zona sem grandes problemas.
Mists of Noyah é uma ideia arrojada que é condicionada pelos inúmeros sistemas que tenta equilibrar na sua jogabilidade. No papel, o seu conceito é aliciante, onde temos a promessa de um RPG de ação fundido com mecânicas de sobrevivência e gestão, mas o que encontramos é um mestre de nada. O combate não é satisfatório e apresenta poucas opções de personalização, o mundo não é denso o suficiente para perdermos horas a explorar e a maioria dos sistemas não são bem introduzidos ou exponenciados durante a introdução, condicionando os jogadores a não utilizar os sistemas como deveriam. Talvez sejam apenas primeiras impressões que podem mudar ao longo das horas, mas quando Mists of Noyah promete um ciclo de dia e noite, onde supostamente a jogabilidade muda, e aquilo que temos é apenas inimigos mais fortes e pouco mais, compreendemos como algo correu mal durante a fase de plano do jogo.
Cópia para análise (versão PlayStation 5) cedida pela QUByte Interactive.