Crítica – Hit Man (Venice International Film Festival 2023)

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Hit Man deixa todos estupefactos com uma das melhores comédias do ano.

Por mais estranho que pareça, perdi todas as obras de Richard Linklater depois de Boyhood em 2014. Num ano onde filmes sobre assassinos e agentes secretos saem praticamente todas as semanas, Hit Man seria apenas “mais um” não fosse realizado pelo cineasta e escrito pelo próprio em conjunto pelo protagonista Glen Powell. Numa altura em que o Festival de Veneza se encontra na sua reta final e o cansaço acumulado começa a pesar significativamente, não há nada melhor que um filme leve e divertido repleto de puro entretenimento refrescante.

Hit Man oferece tudo isto e muito mais. O argumento de Linklater e Powell é o destaque absoluto ao elevar tremendamente uma premissa genérica sobre um professor de filosofia e psicologia que prefere gatos a cães, tem um interesse peculiar por pássaros e, nos tempos livres, trabalha para a polícia em operações que envolvem um falso hitman reunir-se com potenciais criminosos. Num filme que explora temas relativos a identidade e personalidade, Gary Johnson (Powell) vê-se obrigado a transformar-se neste hitman complexo, empregando vários alter egos até o próprio começar a questionar o seu verdadeiro “eu”.

É possível o ser humano mudar quem é numa fase já adulta? São os nossos maiores traços de personalidade fixos ou capazes de variar consoante os eventos que o futuro nos reserva? Por quanto tempo conseguimos fingir que somos outra pessoa sem acabar por fundir algumas dessas caraterísticas “falsas” com a nossa? Hit Man coloca inúmeros dilemas ao protagonista e aos espetadores, o que torna a visualização ainda mais cativante, mas desengane-se quem pense que esta obra é um estudo pesado e lento sobre os seus tópicos, pois Linklater e Powell enchem o seu enredo de momentos extraordinariamente hilariantes num autêntico festival de gargalhadas.

Diálogos brilhantemente executados, incrivelmente memoráveis e muito bem escritos com todos os atores envolvidos em qualquer cena a interagirem uns com os outros de forma quase automática. A camada de humor que engloba Hit Man é tão inteligente, criativa e eficiente que a sala de cinema composta exclusivamente por membros da imprensa aplaudiu efusivamente o fim de uma cena… perfeita. Desde a direção ao diálogo, das prestações ao uso de texto num telemóvel, todos os elementos necessários para construir, desenvolver e concluir uma cena são da mais pura perfeição técnica e deixam o público inteiro com sorrisos de orelha a orelha. Um dos momentos isolados mais satisfatórios do ano.

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Dezenas de linhas simples e de piadas inesquecíveis serão constantemente repetidas ao longo do ano. Hit Man é igualmente uma das obras que melhor aproveita a sua duração, fazendo as praticamente duas horas passarem a voar devido a uma história continuamente envolvente. O primeiro ato coloca o protagonista a vestir – figurativamente e literalmente – as personalidades que considera serem mais apelativas para o cliente, levando a uma montagem fantástica por parte de Sandra Adair que, felizmente, termina antes de se tornar demasiado repetitiva. O guarda-roupa de Juliana Hoffpauir consegue arrancar risos por si só, mas a melhor prestação da carreira de Powell merece os elogios supremos.

O ator incorpora várias personalidades completamente distintas e, apesar de serem sequências curtas, ataca as mesmas com a mesma dedicação e compromisso que a “versão principal”. Desde expressões faciais a movimento de corpo, é uma prestação fascinantemente completa que Adria Arjona complementa na perfeição naquela que é também a sua melhor representação no grande ecrã. Ambos possuem uma química romântica e sexual fora do normal, adicionando uma camada extra de tensão às suas interações. Austin Amelio como Jasper, uma espécie de “polícia mau” no desenrolar do enredo, também impressiona.

É verdade que Hit Man não consegue fugir totalmente à previsibilidade da sua história e os minutos finais são apressados, recebendo mesmo pouco cuidado em relação à linha temporal da obra. Problemas menores que não danificam a desfrutação de um filme que será adorado por audiências pelo mundo fora.

VEREDITO

Hit Man deixa todos estupefactos com uma das melhores comédias do ano num caso mágico de cinema em que realização, argumento e elenco combinam tão bem entre si que, no fim, é difícil resistir a aplausos. Richard Linklater e Glen Powell entregam um argumento insanamente hilariante e genuinamente divertido elevado pela execução técnica perfeita do cineasta e as melhores prestações de carreira de Powell e Adria Arjona. Uma narrativa leve e contínua repleta de diálogo memorável e instigante, explorando noções de identidade e personalidade através da pergunta: “podemos realmente mudar quem somos?”

Uma das experiências de sala mais sensacionalmente agradáveis dos últimos anos.

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