Não são muitas as vezes em que se dá a entender que entre público e artista existe uma ligação muito forte. Aliás, nem sempre se é tão bem recebido no nosso país quanto foi Sevdaliza assim que subiu ao palco do Capitólio na passada quinta-feira. Se as excelentes indicações dadas em passagens por festivais a trouxeram de novo a Portugal, nesta noite, em que a iraniana-holandesa Sevda Alizadeth fez de Lisboa o seu próprio mundo, as certezas foram dissipadas: Sevdaliza é uma deusa que caminha entre nós.
Antes disso, quando entrámos no Capitólio, já a sala se encontrava bem composta. Algum do público deixava-se embalar pelo DJ set de Mr. Herbert Quain, nem que fosse para acalmar os ânimos exaltados dos fãs devotos.
Mas se a calmaria tinha chegado, depressa de desvaneceu assim que se apagaram as luzes e se ouviram os primeiros segundos de “Voodoov”, do mais recente EP The Calling. Acompanhada em palco pelo seu teclista, baterista e violoncelista – que mais tarde apresentava à medida que dançava – Sevdaliza apenas começou por revelar os dedos das mãos enquanto brincava com cabos que se viam nos ecrãs instalados ao fundo do palco. No fundo, estes ecrãs eram espelhos invertidos, um pouco à semelhança do que acontece na capa do disco Ison.
Foi, porém, o tema “Libertine” que trouxe a musa para palco, perto de fãs que ansiavam por lhe dar um beijo (“dá-me um beijo na boca!” ouviu-se lá atrás) ou um abraço.
Quando a vimos no Vodafone Mexefest há um ano atrás, escrevemos que a artista dançava e cantava sem dificuldades, diluindo as sombras na beleza da sua voz. Na altura, esta mulher ainda falou bastante com o público; nesta noite, o discurso foi mais reduzido. Mas isso não é mau: Sevdaliza tem agora uma concepção de espetáculo muito mais apurada e, se antes era mais “crua”, hoje em dia é mais cerebral, sendo cada vez mais fácil deixarmo-nos sugar pelo seu mundo.
A eletrónica das suas canções, próximo dos terrenos do trip-hop, está patente não só nas músicas que já conhecemos, como “Human”, “Soothsayer”, “Shahmaran” ou “Libertine”, mas também no novo material que foi apresentado, como “Kalim” (precedido de um poema), “Rhode” ou uma muito dançável “Darkest Hour”.
Sevdaliza, que parecia ter pés de veludo tal era a facilidade com que dançava, teve sempre a voz no ponto e soube seduzir o público no momento certo. Ora com os olhos fixados na câmara que a seguia pelo palco, ora em jogos de sedução com a bailarina que a secundava no palco, a irano-holandesa controlava-nos a todos, como se ela fosse uma deusa e nós os seus servos.
Pelo meio, “That Other Girl” foi muitíssimo celebrada – ao nosso lado continuavam a cantarolar o refrão após o término da música – e uma ida ao piano com (o novo) tema “Key”, nem a propósito.
Para o final, o hit “Marilyn Monroe”, que deu a conhecer o nome Sevdaliza a muita gente. Regressada a palco, perguntou aos lisboetas se queriam mais. A resposta não se fez tardar e a música também não: “Loves Way” fechava com chave de ouro um concerto que levou os fãs à loucura. A jovem descia depois para junto do público das filas da frente para distribuir beijos e abraços.
Pouco antes do fim do espetáculo, Sevdaliza, numa das poucas vezes que se dirigiu ao público, disse: “Vocês salvaram a minha vida. Amo-vos tanto. Vocês não fazem mesmo ideia”. Bem, a julgar pela afluência e amor com que foi recebida, podemos dizer que o sentimento é bem recíproco.
Fotos de: Carlos Mendes