Com humor, alma e uma mão-cheia de amigos, Samuel Úria transformou o Coliseu Porto Ageas numa festa memorável.
Numa sala imponente e muito bem composta (quase esgotada), Samuel Úria apresentou-se pela primeira vez em nome próprio no Coliseu Porto Ageas e muito bem acompanhado de uma banda com 6 elementos e um coro de 8 elementos. Ao longo de duas horas de concerto, o artista desfilou as suas músicas que já fazem parte da mobília da pop nacional com a ajuda dos amigos que facilmente fez dentro do mundo da música.
Como gosta e foi hábito nos dois Coliseus (dos Recreios e do Porto), Samuel Úria iniciou o seu espetáculo com “1998”, a música que começa numa espécie de ambiente medieval em tom de western spaghetti e que retrata o seu baile de finalistas do secundário a dançar a “Tree” de preto, com a banda que serviu de inspiração para a sua entrada no mundo da música: Blind Zero.
De seguida, “2000 A.D.”, o nome do álbum, single Antena 3 e que lhe valeu um globo de ouro, é descrito como uma das suas primeiras grandes mudanças na sua vida, por se tornar o ano em que começou a “sacar música ilegalmente”. “Canção de Águas Mil” é a canção pedida pela RTP sobre uma qualquer outra data que fez 50 anos e sobre a missão da estação televisiva de serviço público de excelência, data esta que devia ser uma festa como esta noite, com a apresentação de todos os músicos.
“Pedra e Cal” é uma música que é bem mais do que um sarau de Verão – um valente obrigado sentido do próprio em dedicar àqueles que tocaram com ele aos 15 anos no Hard Club e em Sintra com a cara em obras e que ainda eram uns meninos de coro.
A primeira convidada, de nome Carol, é apresentada como a voz de fogo e mel oriental que poderia fazer parte de qualquer telenovela brasileira da Globo, mas apenas tem uma com a sua pronúncia típica de Vila Nova de Gaia, juntando-se em “Daqui para trás” e “Essa Voz”.
“Xico da Ladra” foi o momento mais sentimental da noite porque recorda o amigo que perdeu recentemente, amigo esse que fica conservado numa canção. “Kuchisabishii” apresenta todo o movimento de ancas de Úria com a entrada a meio de Margarida Campelo, apresentada como a artista mais jazz da noite que faz coisas que o próprio Samuel Úria nem se atreveria porque o fracasso seria óbvio. Numa noitada de YouTube a altas horas, descobriram uma música de Paulo de Carvalho que ousaram fazer uma versão: “Foi Aparecida”.
“Pensavam que eram só meninas bonitas?”, atira-nos Samuel Úria a meio de “Grandiloquência do Roque-Enrole” e “Era de Ouro”, que nos surgem durante uma mudança do cenário de fundo e com as Velhas Glórias. Estava na altura de puxar pelos pulmões e pelo rock feito com uma banda acelerada até fugirem para Coimbra, um subúrbio de Tondela e uns amigos de Sintra que marcaram o rock and roll português há 25 anos.
Caído o pano, o artista desce para o meio da plateia com o coro e apenas guitarra para nos apresentar “Quem me Acende a Voz”. O artista português, que normalmente fica chateado por os seus convidados terem mais aplausos que o próprio, traz para perto dele o grande talento do Norte, aquela que é uma instituição da própria música nacional: Manuela Azevedo.
A gaguez ou falta de palavras para elogiar a vocalista dos Clã desvanece nos dois duetos “Canção de Água Doce” e “Carga de Ombro”, a música que quem não conhece deve ter vindo ao engano. Já em “Fusão”, Manuela Azevedo afirma que a festa é do Samuel… e que será sempre do Samuel.
No meio de piadas futebolísticas para justificar a indumentária vermelha da noite e elogios a Carlos Daniel, o beirão canta-nos “A Contenção”, canção que o próprio adora tocar por ter sido descoberta pelas novas gerações. Pouco depois, foi a vez de Milhanas, artista que nasceu depois do 1º Big Brother, subir a palco, para um “Vem Por Mim” e “Mundo”.
Entra em palco Gisela João para “Um Dia Depois”, que deixou o cancioneiro português totalmente arrepiado. A artista acabaria por substituir o aniversariante do dia (Manuel Cruz), que não pode estar presente devido a compromissos artísticos, para cantar a sensibilidade masculina como nunca antes feita em “Lenço Enxuto”.
Esgotados os convidados, e para encerrar este sacrilégio, Samuel Úria lança-nos uma música antiga do agrado geral, “Teimoso”, justificando como sendo uma música de carácter pessoal do ser humano. Para o encore estava guardado “Graça Comum”, “Beijas Como Uma Freira” com Tiago Guilul e “É Preciso que eu Diminua”, provavelmente a música com mais ginga do artista e que colocou todo o Coliseu num alvoroço de dança.
Para a despedida e segundo encore, “Um Adeus Português”, uma homenagem à música portuguesa, e em especial à língua mais rica do mundo que é a portuguesa, através de um poema português escrito por Alexandre O’Neill.
Samuel Úria terminou de coração cheio por esta ter sido a sua festa, com os seus amigos que fez dentro do panorama musical e que o deixam cheio de orgulho, quer estejamos em 1998 ou em 2000 A.D.
Foto de destaque de: Lara Jacinto
