Num edifício com mais de dois séculos de memórias, o antigo palacete da Baronesa de Nossa Senhora de Oliveira renasce como o primeiro hotel da marca Mercure nos Açores, o Mercure Ponta Delgada Açores, unindo o charme histórico ao design contemporâneo e à alma da ilha.
No coração do Atlântico, os Açores mantêm o magnetismo silencioso dos lugares que parecem existir fora do tempo. São nove ilhas moldadas por vulcões e rodeadas por bruma, onde a natureza dita o ritmo e o homem se move ao compasso das marés. Ponta Delgada, na ilha de São Miguel, é o seu principal ponto de chegada, uma cidade de fachadas brancas e portões de ferro forjado, onde o passado e o presente convivem numa harmonia discreta.
Foi aqui, entre a arquitetura pombalina e o murmúrio do porto, que o antigo palacete dos Barões de Nossa Senhora de Oliveira encontrou nova vida. O edifício, erguido no final do século XVIII, foi primeiro residência de Simão José Silveira, comerciante vindo de Valença do Minho, e depois do seu filho, Jacinto Inácio da Silveira, um próspero negociante de laranjas, produto que durante décadas sustentou a riqueza micaelense. Foi também aqui que D. Maria Isabel Gago da Câmara, a célebre baronesa de Nossa Senhora de Oliveira, dançou com D. Pedro IV em 1832, durante a passagem do monarca liberal pelos Açores.
Ao longo dos séculos, esta casa acompanhou a história de Ponta Delgada. Viu nascer a República, acolheu jantares de intelectuais e, já no século XX, transformou-se na icónica Pensão Central, ponto de encontro de viajantes e local de memórias familiares para gerações de micaelenses. Foi palco de celebrações, de tertúlias, e de um certo encanto cosmopolita que descia do porto com o cheiro a maresia.
Encerrada nos anos 90, a Pensão Central renasceu recentemente sob a insígnia Mercure, do grupo Accor, devolvendo à cidade o brilho de outrora. O Mercure Ponta Delgada Açores, aberto desde abril deste ano, abre assim as portas do passado à modernidade, preservando o traço histórico do edifício original e acrescentando-lhe um novo corpo arquitetónico, discreto e elegante.
O tema da “Viagem” percorre todo o hotel, em homenagem à importância dos Açores como encruzilhada atlântica desde o século XIV. A decoração mistura mapas náuticos, malas antigas, bússolas e referências às rotas dos navegadores portugueses, criando uma narrativa visual que liga o arquipélago ao mundo.
O Mercure Ponta Delgada Açores dispõe de 75 quartos, divididos entre a ala histórica e o edifício moderno. Muitos têm varandas amplas com vista sobre o centro histórico e o mar. No interior, o conforto contemporâneo encontra o requinte clássico, com linhas simples, tons neutros e detalhes inspirados na paisagem açoriana.
O Bruma Lounge Bar & Bistro, aberto a hóspedes e locais, é o coração social do Mercure Ponta Delgada Açores. O nome vem da neblina que tantas vezes envolve a ilha, e também da canção “Bruma”, que evoca esse mesmo ambiente etéreo. Aqui servem-se cocktails de autor criados a partir de ingredientes locais: vinho da ilha do Pico, chá da plantação de Gorreana, mel de incenso, notas de mar e floresta. Cada bebida conta uma história do território. A carta gastronómica segue o mesmo princípio: celebra os sabores regionais com um toque contemporâneo, sob o lema Discover Local.
Este conceito, transversal à marca Mercure, traduz-se num convite à descoberta da cultura e da autenticidade de cada destino. No caso dos Açores, essa imersão estende-se a colaborações com artesãos locais, como as miniaturas em escamas de peixe ou os presépios em basalto, e à criação de um guia digital personalizado, que sugere percursos fora dos circuitos habituais, mitos, lendas e ligações com a comunidade.
Para quem procura descanso, o Mercure Ponta Delgada Açores oferece duas piscinas exteriores de água salgada – uma para adultos e outra para crianças -, além de uma piscina interior climatizada, sauna, banho turco e uma zona de spa com tratamentos assegurados por terapeutas locais. Há também uma sala de reuniões para até 60 pessoas, reforçando o equilíbrio entre lazer e negócios.
Entre paredes que guardam ecos de bailes oitocentistas e memórias de hóspedes de outro tempo, o Mercure Ponta Delgada Açores assume-se hoje como um ponto de partida para descobrir São Miguel, uma ilha onde a História, a natureza e a bruma continuam a misturar-se, tal como o fizeram desde o início das viagens. Aliás, foi precisamente isso que fizemos no passado mês de setembro, durante uma press trip de três para conhecer não só o hotel, mas também outros pontos de destaque.
Após a nossa chegada ao Mercure Ponta Delgada Açores, e já depois de um rápido check-in, os portugueses foram aos respetivos quartos descansar um bocadinho da viagem enquanto se aguardava pelos colegas espanhóis. No meu quarto, bem espaçoso por sinal, e com vista para a piscina exterior do Mercure Ponta Delgada, descobri uma cama não só enorme, mas extremamente confortável, onde viria a ter duas excelentes noites de sono durante esta press trip.
Mas não era tempo de dormir; antes descobrir a ilha. Após uns minutos de descanso e energia restabelecida com uma mesa de snacks especialmente preparada para nós, apanhámos um autocarro que nos levou para as Sete Cidades.
Lagoa das Sete Cidades – Uma das 7 Maravilhas Naturais de Portugal
Na zona ocidental da ilha de São Miguel, nos Açores, encontra-se a Paisagem Protegida da Bacia das Sete Cidades, um dos lugares mais emblemáticos do arquipélago e uma das 7 Maravilhas Naturais de Portugal. Neste cenário de origem vulcânica, destacam-se as célebres lagoas Verde e Azul, que, segundo a lenda, nasceram das lágrimas de um pastor e de uma princesa separados por um amor impossível. A partir do miradouro da Vista do Rei, ponto que evoca a visita de D. Carlos e da rainha D. Amélia em 1901, é possível contemplar a vista ampla sobre a caldeira e compreender a dimensão deste património natural.
Com cerca de 2173 hectares, a área protegida abrange o vulcão central das Sete Cidades, cuja caldeira de colapso, de forma quase circular, atinge 5,3 quilómetros de diâmetro e cerca de 630 metros de profundidade. Formada há aproximadamente 36.000 anos, esta estrutura é um testemunho do passado geológico da ilha e integra o Geoparque Açores, reconhecido pela UNESCO como Geoparque Mundial. No interior desta formação imponente coexistem lagoas, cones de tufos, domos traquíticos e depósitos de pedra-pomes, elementos que revelam a intensa atividade vulcânica que moldou o território.
As Lagoas Verde e Azul dominam o interior da caldeira, mas não são as únicas. As lagoas de Santiago e Rasa, localizadas em crateras de explosão de vulcões secundários, reforçam a complexidade geológica da região. A última erupção conhecida dentro da caldeira terá ocorrido em 1439, no cone de pedra-pomes da Caldeira Seca, assinalando o fim de um ciclo eruptivo que definiu grande parte da paisagem atual.
A sudeste, a cordilheira vulcânica da Serra Devassa prolonga o sistema das Sete Cidades, desenhando um conjunto de cones de escórias orientados no sentido noroeste-sudeste. Neste relevo encontram-se pequenas lagoas de grande interesse ecológico, como as do Carvão, das Empadadas, Rasa, das Éguas e do Canário, que completam a variedade de ecossistemas presentes nesta área de elevado valor natural.
A vegetação é dominada por espécies endémicas dos Açores, entre as quais se destacam a alfacinha (Lactuca watsoniana), a angélica (Angelica lignescens), a labaça-das-ilhas (Rumex azoricus) e o trovisco-macho (Euphorbia stygiana stygiana). A diversidade de habitats atrai também várias aves migratórias, como a garça-real (Ardea cinerea) e o galeirão-comum (Fulica atra), reforçando a importância ecológica deste território protegido.
Eleita como uma das 7 Maravilhas Naturais de Portugal, a Lagoa das Sete Cidades é classificada como massa de água protegida no âmbito do Plano de Ordenamento de Bacia Hidrográfica e reconhecida internacionalmente como Sítio Ramsar, ao abrigo da Convenção das Zonas Húmidas. Este estatuto confirma o seu valor ambiental, científico e paisagístico, tornando as Sete Cidades não apenas um símbolo dos Açores, mas também um exemplo notável da harmonia entre a natureza e a história humana.
De facto, são paisagens lindíssimas e de cortar a respiração. E até nos foi possível apreciar mais de perto, pois após uma paragem para almoçar na casa de chá O Poejo, pegamos em bicicletas elétricas e, durante cerca de uma hora de passeio, passámos pela zona da Lagoa Azul, que é tão linda como podem imaginar. “Parece a Noruega”, disseram-me, após ter partilhado algumas fotos. E eu, que efetivamente já estive na Noruega, não discordo.
Já no regresso ao centro de Ponta Delgada, onde tivemos algum – pouco, vá – tempo livre, fomos depois transportados para o norte da ilha, mais precisamente para a Praia de Santa Bárbara, para um jantar muito agradável no Tuká Tulá. O programa também previa uma visita à fabrica de cerveja local, mas teve mesmo de ficar para outra ocasião.
Vimos golfinhos e baleias, visitámos as caldeiras vulcânicas e relaxámos nas águas termais
O segundo dia desta excursão aos Açores começou, claro, com um belíssimo pequeno-almoço no Mercure Ponta Delgada Açores. Não faltou nada – muitos pães e croissants, fatias de bolo, panquecas e respetivas compotas, vegetais grelhados, cogumelos, salsichas, bacon e ovos, queijo, doçaria regional e, claro, o inconfundível bolo lêvedo. Para bebidas, havia água, vários sumos e uma máquina para quem quisesse café ou outro tipo de bebidas quentes.
Pouco depois, dirigimo-nos para a zona das docas, onde iríamos fazer uma excursão para observação de baleias e golfinhos. Rapidamente percebemos porque é que os Açores se destacam como um dos destinos de referência mundial para a observação de cetáceos. Nas águas que rodeiam o arquipélago podem ser identificadas cerca de 25 espécies diferentes, algumas residentes e outras que passam durante as suas rotas migratórias. Entre os avistamentos mais frequentes encontra-se o Cachalote (Physeter macrocephalus), o maior dos cetáceos com dentes, conhecido pela imponência que inspirou o célebre romance Moby Dick. Este colosso dos oceanos pode atingir cerca de 18 metros de comprimento e pesar até 44 toneladas.
Além do cachalote, é comum observar outras espécies de grande porte, como a Baleia-azul (Balaenoptera musculus), considerada o maior animal existente, e a Baleia-comum (Balaenoptera physalus), uma das mais rápidas entre as grandes baleias. A diversidade marinha da região inclui ainda tubarões, tartarugas e uma notável variedade de golfinhos, entre os quais o Golfinho-comum (Delphinus delphis), o Roaz (Tursiops truncatus) e o Golfinho-pintado (Stenella frontalis). A conjugação destas espécies com o cenário natural do arquipélago faz dos Açores um dos pontos mais privilegiados do planeta para observar a vida marinha no seu estado selvagem.
Sim, vimos muitas famílias de golfinhos, bem como duas baleias, embora quase só tivesse dado para ver a parte da cauda. Deixo, no entanto, dois alertas: a excursão é bastante demorada e é feita numa lancheira com vários lugares muito apertados, pelo que não será uma viagem propriamente muito agradável, tendo em conta os vários embates contra as ondas do mar. Portanto, se são daquelas pessoas que ficam indispostas em alto-mar, muito provavelmente não será uma viagem recomendada. O outro aviso? Não comam demasiado ao pequeno-almoço…
Feita a excursão, estava na hora de regressar para a zona do hotel para a nossa próxima paragem de autocarro: as caldeiras vulcânicas.
Com cerca de 3.150 hectares, a área situada no interior da caldeira do Vulcão das Furnas é uma das zonas mais emblemáticas do arquipélago. O vulcão central, moldado por múltiplas erupções ao longo de cerca de 800.000 anos, intercaladas por fases de inatividade, apresenta uma ampla depressão no topo, a Caldeira das Furnas, de forma elíptica, com cerca de oito quilómetros no eixo maior e 5,6 no menor.
Classificada como geopaisagem e geossítio do Açores Geoparque Mundial da UNESCO, esta zona reúne uma grande diversidade geológica. A Lagoa das Furnas, com aproximadamente 200 hectares, é o elemento mais visível, rodeada por cones de escórias, anéis de tufos, domos traquíticos como os do Pico do Ferro e vários campos fumarólicos. A abundância de nascentes, águas minerais e termais valeu-lhe a designação de “hidrópole” das Furnas.
O aproveitamento das características geotérmicas é uma tradição enraizada. Os banhos termais, a aplicação de lamas vulcânicas e o uso de águas minerais fazem parte da vida local, tal como o conhecido Cozido das Furnas, preparado em covas no solo quente, onde permanece a cozinhar entre cinco e seis horas.
A vegetação combina espécies exóticas e invasoras, sobretudo nos jardins botânicos, com plantas endémicas como o azevinho (Ilex azorica) e o louro-da-terra (Laurus azorica). Estas, juntamente com outras espécies nativas, têm sido reintroduzidas no âmbito de projetos de recuperação ecológica da lagoa. No que toca à fauna, destaca-se o morcego dos Açores (Nyctalus azoreum), o único mamífero endémico do arquipélago.
Inserida na Rede Natura 2000 como Zona de Proteção Especial e classificada como Sítio Ramsar, esta área integra também o conjunto de zonas protegidas dos concelhos de Povoação e Nordeste distinguido com a Carta Europeia de Turismo Sustentável em Áreas Protegidas, atribuída pela Federação EUROPARC.
Foram várias as famílias a retirar o seu cozido, independentemente do cheiro a enxofre. Há quem diga que o sabor a enxofre se sente no cozido, mas não foi esse o caso durante o nosso almoço no Restaurante Banhos Férreos, onde nos deliciámos precisamente com um fantástico cozido, com destaque para a carne, tão suave que mal deu trabalho a mastigar. Maravilhoso.
De barriga ainda cheia, seguimos para outra paragem altamente recomendada: Parque Terra Nostra, onde muita gente se concentra no seu Tanque Termal.
Também aqui há novidades. O espaço reabriu ao público em abril deste ano após a conclusão de um conjunto de obras de melhoria. Foi sujeito a intervenções que abrangeram a valorização da sua envolvência, como a instalação de um novo sistema de recirculação de água e a renovação dos revestimentos.
A renovação teve em consideração a relevância histórica e natural do Parque Terra Nostra, um dos principais pontos turísticos da ilha de São Miguel. O interior do Tanque também foi alvo de melhorias, com a aplicação de um novo revestimento que visa aumentar o conforto e o bem-estar dos banhistas. Para melhorar a dinâmica da água no espaço, o número de bicas de entrada foi alargado, passando de duas para seis.
A modernização incluiu, ainda, a instalação de um sistema de recirculação forçada da água termal, que pretende garantir uma gestão mais eficiente e sustentável do recurso, sem comprometer as características naturais das águas.
Foi difícil sair daquela água termal, num dos mais belos jardins da Europa, mas tivemos de regressar ao hotel para descansar um pouco e ganhar apetite para o jantar. A refeição foi no São Jorge Restaurante, e embora os pratos de carne tenham feito sucesso, o mesmo não se pode dizer de quem optou pelo peixe – nenhum dos colegas, portugueses ou espanhóis, comeu sequer meio peixe…
Ananases, piscinas naturais de Caloura e queijadas
Último dia da excursão, que começou com mais um belíssimo pequeno-almoço no Mercure Ponta Delgada Açores – havia nesta manha uns mini cheesecake de coco e chocolate que nem vos conto…
Daí seguimos para algo também incontornável em São Miguel: as plantações de Ananás. A cultura do ananás em São Miguel tem raízes que remontam ao século XIX, quando a variedade Cayenne (Ananas comosus L. Merril) foi introduzida na ilha, em 1850. Originalmente cultivado como planta ornamental, o ananás acabou por ganhar importância económica, tornando-se um dos produtos agrícolas mais emblemáticos dos Açores.
A produção desenvolveu-se em estufas de vidro, estrutura que se mantém até hoje e que permite recriar as condições tropicais necessárias ao crescimento do fruto. Este método, totalmente artesanal, exige tempo e cuidado: entre a plantação e a colheita decorrem cerca de dois anos. Durante esse período, cada fase do processo é acompanhada com precisão, desde a plantação e o fumo – técnica tradicional que estimula a floração – até à maturação final.
Com mais de um século de história, as estufas de ananases A. Arruda representam um testemunho vivo desta tradição agrícola. Nelas é possível observar de perto o ciclo completo do cultivo do ananás, tal como era feito pelas gerações anteriores. A continuidade destas práticas garante não apenas a qualidade e singularidade do fruto, mas também a preservação de um método de produção que se tornou parte integrante da identidade agrícola e cultural micaelense.
Bebemos, claro, um belo suminho de ananás, realmente bastante diferente daquele a que estamos acostumados. Depois, uma paragem rápida para aconchegar o estômago com algumas Queijadas da Vila Franca, doce tradicional de origem conventual com raízes que remontam a finais do século XVI. Reza a história que a sua criação ocorreu por volta de 1593, quando as primeiras freiras chegaram a Vila Franca após o terramoto. Nessa altura, as religiosas utilizavam as claras de ovo para engomar as vestes, o que gerava um excesso de gemas. Para evitar o desperdício, começaram a preparar as queijadas, cuja receita se manteve guardada dentro das paredes do convento durante várias gerações.
A forma como a receita saiu do convento permanece envolta em mistério. Há quem defenda que o segredo foi levado por jovens de famílias abastadas que ali estudavam; outros acreditam que terá sido revelado por leiteiros que forneciam o convento e acabaram por aprender a confeção do doce. No entanto, nenhuma destas versões foi confirmada…
Daí seguimos para as Piscinais naturais de Caloura, sendo que alguns colegas aventuraram-se em banhos, embora o tempo não estivesse propriamente muito convidativo. Já de regresso ao hotel, também tivemos um excelente almoço no restaurante do Mercure Ponta Delgada Açores, o BRUMA, que aposta em ingredientes frescos, na atenção à apresentação de cada prato e, claro, num serviço cuidado.
Chegava assim, ao fim, a nossa excursão a São Miguel, para conhecer o novíssimo Mercure Ponta Delgada, onde certamente iremos regressar em breve. Mais do que um hotel, o Mercure Ponta Delgada Açores simboliza a união entre tradição e modernidade, reforçando o papel dos Açores como destino de excelência e contribuindo para o desenvolvimento local.
