Na passada sexta-feira, dia 27 de maio, o espaço cultural M.Ou.Co, no Porto, recebeu Kae Tempest para um concerto integrante da tour do seu novo álbum, The Line is a Curve. E foi tudo o que prometia e muito mais.
Numa tarde de sol radiante e calor intenso a romper a barreira dos 30 graus, a sala de concertos do espaço cultural M.Ou.Co, localizada na cave enegrecida do edifício, onde reinava uma frescura sem igual, recebeu Kae Tempest. E o que se antevia ser uma experiência despida de proximidade e, por ventura, impessoal, acabou por se tornar num momento intimista com a artista, que não só fez aquecer o ambiente na sala, como o coração daqueles que a compuseram.
The Line is a Curve é o mais recente álbum de Tempest, tendo sido lançado a 8 de abril deste ano e foi um dos meus escolhidos para a lista de álbuns essenciais do mês em causa. Confesso que, apesar de já conhecer trabalhos de Tempest, tinha ainda muito por descobrir sobre a artista. Todo o processo desde 8 de abril até o fim do concerto no Porto foi extremamente entusiasmante e gratificante. É por artistas como Kae Tempest que dá gosto ouvir e escrever sobre música.
Tempest começou a tour dedicada ao seu novo álbum ainda em abril, mas este concerto único em Portugal foi especial. Isto porque para além de inesperado, foi a primeira paragem fora das ilhas Britânicas, na sua exposição europeia que passou neste fim de semana por Espanha. Seguem-se Itália, Holanda, França e Bélgica.
O público que passou o serão de sexta no M.Ou.Co teve direito a uma exposição completa do álbum The Line is a Curve, com a setlist de acordo com a sequência do álbum. Essa passagem, cheia de momentos altos e gloriosos, acompanhados sempre de um ótimo jogo de luzes e conjugação de cores, viu o seu ponto alto quando Clare Uchima (teclado e sintetizador) assumiu também os vocais, em “No Prize”. No álbum, foi Lianne La Havas quem colaborou com Tempest, mas Uchima não lhe ficou a dever muito, num dos momentos mais expansivos e bonitos do concerto. Quase a terminar a apresentação do novo álbum vimos Tempest a meter a sala toda a dançar, conscientemente ou não, com “Move” e “More Pressure”.
Como as boas novidades nunca vêem só, Tempest não ficou por aí. Com uma breve passagem por “Brand New Ancients” que serviu de momento pivotal, a artista britânica presenteou os fãs de longa data. Estes puderam matar saudades com uma passagem breve, mas poderosa, a algumas das músicas mais emblemáticas de álbuns anteriores, tais como “Europe Is Lost”, do álbum Let Them Eat Chaos, que serviu de arranque para a segunda fase musical do concerto. Tenho a dizer que continua atual, fazendo mais sentido que nunca; “Marshall Law” do seu álbum de estreia, dedicada aos que a seguem desde o primeiro dia; e “People’s Faces” a servir de despedida, num momento emocional recheado de sinceridade e genuinidade.
Ainda que tenha adorado e ache que o espaço adornou muito a experiência, Kae Tempest e Clare Uchima (que foi também ela uma estrela) mereciam ainda mais. Em contrapartida, sinto-me afortunado por ter vivido esta experiência de proximidade física e emocional com os artistas, que nem sempre é possível noutros locais e neste caso fez mais sentido que nunca.
Tempest entrou sob uma chuva de aplausos e mostrou gratidão, música após música, presenteando a audiência com um espetáculo sensacional, com a capacidade de desbloquear as expressões mais sisudas. Os decibéis dos aplausos cresceram exponencialmente ao longo do concerto, tendo chegado ao expoente máximo de beleza na despedida emocional e ternurenta de Tempest e Uchima. Aplausos, assobios e gritos que se estenderam ao longo de vários minutos, só tendo terminado algum tempo após Tempest ter abandonado o palco em definitivo.
Kae Tempest foi ao Porto e deixou a Invicta pela porta grande, a missão foi cumprida com sucesso. Dos feedbacks que recolhi de alguns dos presentes, todos foram extremamente positivos, principalmente alusivos à energia e qualidade musical de Tempest ao vivo.
Este foi o meu regresso oficial a concertos internacionais pós-pandemia e não só subscrevo tudo o que me chegou aos ouvidos, como tenho a dizer que foi um dos concertos que mais me tocou até à data.