GNR celebraram 45 anos no Coliseu dos Recreios com energia intacta e convidados de luxo. Uma viagem pelo melhor do rock português.
Quatro coliseus cheios – dois do Porto e dois Lisboa – impressionam sempre. No caso, serviram para celebrar a Operação STOP – Somos Todos Obrigados a reparar. A piada é forçada sim senhor, mas o imaginário dos GNR obriga a estas coisas, e 45 anos de vida artística ininterrupta a alto nível nem Portugal não é coisa de somenos para celebrar. Na verdade, não há nada parecido.
Com muita fina flor do meio artístico vista a entrar no auditório mais icónico da capital e poucos minutos de atraso, o espectáculo começa com os filhos de Tóli César Machado, Rui Reininho e Jorge Romão em palco na vez dos pais a tocar “Espelho Meu”, do grande Independança. Abertura bonita e emocional – além de inter-geracional, com o público de todas as idades a aplaudir.
Depois, “Bem vindo ao passado” dá a dica para a entrada em cena dos Reis do Roque, antes do primeiro pico com “Vídeo Maria” tocada a neons rosa. Tempo para recordar In Vivo, álbum ao vivo gravado em 1990 precisamente numa sessão dupla na Rua das Portas de Santo, em que se falou também em atirar água benta. Álbum esse que deu muita polémica na altura pelo processo judicial colocado por Vítor Rua, aquele cujo nome nunca pode ser dito em palco, pela utilização de “Portugal na CEE” e “Sê Um GNR” . No fim de contas, foi preciso editar novos vinis e cd’s, mas o disco de platina chegou à mesma para o Grupo Novo Rock.
Pouco depois aparece um contorcionista (o artista circense Saulo Roque) por cima dos artistas por alturas da recente “Eu não sou assim”, e pouco depois “Mais vale nunca” leva Reininho a erguer a sua taça a todos, para citar António Silva (o grande ator popular, não o central questionável). “Efectivamente” é novo momento de festa e, pela primeira vez, a plateia meio tímida levanta-se em grande número. Mais tarde, um elemento no palco ligará a luz do telemóvel para haver resposta do outro lado e reforçar a interação.
“Pronúncia do norte” é um hino nacional, como mais um vez se prova com a receção excitada às teclas de Toli César Machado, o verdadeiro faz tudo. Logo a seguir, Gisela João entra para fazer o dueto e dizer toda contente no fim que é de Barcelos e acabou de cantar com os GNR (voltará mais tarde para a subvalorizada “Voos domésticos”, original do álbum de versões com o mesmo nome). Reininho, esse, diz que o rio que corre para o mar são os nossos corações.
A “música mistériosa” como é chamada “Bellevue”, tocada com baixo aparentemente italiano de uma certa marca Farioli (noite muita inspirada nos trocadilhos) continua a ser arrepiante, uma jóia gelada no portefólio pop dos portuenses, e dá o mote para a reta final com “Morte ao Sol”, “Sexta-Feira (um seu criado)” e “Sangue Oculto” (aqui sem Javier Andreu dos La Frontera, como aconteceu há dez anos atrás no Campo Pequeno). Em compensação, o primeiro encore tem a sempre ótima “Las Vagas” e, depois, a especialmente feliz colaboração com Samuel Úria em “Quero que vá tudo pro inferno” de Roberto Carlos. Finalmente, quase toda a gente a tirar os rabos das cadeiras.
Por fim, “Ana Lee”, e claro, “Dunas” – aqui com todos os intervenientes em palco, filharada incluída. Os GNR continuam em bela forma, a fazer lembrar fortificados envelhecidos em bons cascos de carvalho, com o eterno punk Samuel Palitos na bateria e o sangue novo de Ben Monteiro na guitarra e teclas a manter a frescura em palco. Até a próxima, e os 50 vão ter mesmo que acontecer.
