Primavera Sound Porto 2025, Dias 3 e 4 – Fim de Semana de musico-terapia

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Embora 13 anos depois da estreia seja inegável que estamos longínquos da tal versão gourmet de Barcelona e de alguns dos seus pontos altos, parece ter-se chegado a um ponto de equilíbrio no Primavera Sound Porto.

Em mais um dia bonito no Parque da Cidade (São Pedro foi clemente este ano), o primeiro impacto é o de David Bruno, que enche o palco Revolut e entra a matar a dizer que é o primeiro artista de Gaia a marcar presença em duas edições consecutivas do Primavera Sound Porto. Há Rui Reininho em fato de treino, há António Bandeiras a rapar o cabelo ao reflexo de uma bandeja de inox, qual Travis Bickle das Caxinas que depois irá trepar a estrutura do palco, há acima de tudo slogans imorredoiros como “Caloteiro” ou “Gondomar” que o povo canta. No fundo, há tudo o que um certo e muito especial público gosta. E “Inatel”, claro. Pena de se ter perdido Horsegirl, mas há forças telúricas difíceis de ignorar.

Para falar de outra coisa, Kim Deal está no palco Porto com pleno desfile de dez músicos, coisa rara nos tempos de hoje. Após a primeira música, a antiga baixista dos Pixies e vocalista dos Breeders pega numa folha e lê encómios em português. Está bonito o esforço, e segue-se concerto competente com o início baseado no bem recebido disco a solo Nobody Loves You More, e na segunda metade por versões de Breeders – claro que com “Cannonball”, mas também com uma “Gigantic” lá mesmo no fim. Apesar de algum desfoque no som, bem acima da memória que temos da última vez que a vimos ao vivo.

Kim Deal no Primavera Sound Porto 2025 – Foto: Emanuel Canoilas
Kim Deal no Primavera Sound Porto 2025 – Foto: Emanuel Canoilas

Os australianos Parcels não têm propriamente material novo a mostrar, mas há muito público estusiasta para os receber, o que os levou a certa altura a dizer que estavam no seu “favourite place to play”. Se não é verdade, poderia muito bem ser, com a guitarra setenteira de “Tieduprightnow” a ser recebida como hino de fim de tarde. Até houve tempo para a portuguesa Maro ser chamada a palco para ajudar em “Leaveyourlove”. Fez sentido naquela conjunção astral.

Depois daquela leveza veraneante, há assuntos sérios pela frente. Que é como quem diz, Destroyer. Dan Bejar e companheiros chegam em momento de vento frio a soprar no palco Super Bock, qual anúncio de clima canadiano que obriga a colocar os casacos. Dan leva calça beije, blazer, dois copos de cerveja e muitos papéis para colocar no chão do palco. Com o recente Dan’s Boogie no bolso, vai cerzindo o novo com os clássicos de um dos grandes catálogos de canções das últimas décadas, como “Times Square” de Poison Season, ou a hipnótica “Tinseltown Swimming in Blood” de ken. Das novas, destaque para “Bologna”, e pouco depois chega “Kaputt” e “Chinatown” do disco-monstro que é Kaputt. Jogar com trunfos tão fortes é quase batota, o trompete de JP Carter a ressoar colina acima e nós a sonhar.

Já depois das 22h existia um dos duelos mais interessantes em termos de divisão de público, Haim vs Squid. Muito embora as três irmãs californianas dessem um concerto de som simpático, acabou por ser impossível impor um Tordesilhas temporal perante o tamanho da sova que os de Brighton deram.

primavera sound porto 25 squid
Squid no Primavera Sound Porto 2025 – Foto: Emanuel Canoilas

A cena de Windmill, pub em Brixton onde fermentou um pós-punk com experimentalismo progressivo, tem gerado filhos difíceis de bater ao vivo. Arranque com “Crispy Skin” (do álbum de 2025, Cowards) e “G.S.K.” (do anterior Bright Green Field), antes de passagem pelo grande “Building 650”. Músicas tocadas a longo, performance ao vivo a dar camadas extra de vida às gravações áudio, os Squid dão lição do que deve ser realmente um concerto ao vivo em plena idade de formatação. A bateria fantástica de “The Cleaner” a dar prova viva disso, antes da descida final com “Cro-Magnon Man” e “Pamphlets”. Estaladão.

Por último, e para efeitos de crónica, os Cap’n’Jazz. A banda hardcore do Illinois, por vezes catalogada de emo do Midwest, deu concerto de bom recorte, muito embora na verdade se tenha questionado algumas vezes o que é que estavam ali a fazer. Questionamento existencialista, característico dos seus temas favoritos em termos de abordagem musical. Lá longe, Jamie XX já faz a festa para a galera que quer abanar o capacete, com muita luz à mistura. Um mundo de diferenças, disponível no mesmo lugar.

Numa edição que conseguiu correr habitualmente e sem crises, referência ainda para o último dia, um domingo pouco habitual que contou com animação eletrónica no recinto – destaque a Mura Masa versão DJ set e a Paul Kalkbrenner, que animaram uns bons milhares até às 11h. Boa iniciativa, a juntar-se aos concertos do dia 10 de junho na cidade e que revela algum carinho que, por vezes, tem faltado no passado. Embora 13 anos depois da estreia seja inegável que estamos longínquos da tal versão gourmet de Barcelona e de alguns dos seus pontos altos (já nem há livro com os artistas dos cartaz, o souvenir máximo dos tempos heroicos do festival), parece ter-se chegado a um ponto de equilíbrio no Primavera Sound Porto, ainda com direito a muita coisa boa.

Bruno Rocha Ferreira
Bruno Rocha Ferreira
Apaixonado por vinhos e boa música, o Bruno Rocha Ferreira cobre eventos vinícos, concertos e festivais de música. Também gosta de stand up comedy de qualidade.
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