O Pena D’Água, hotel instalado numa mansão do século XIX na Covilhã, combina arquitetura histórica e soluções sustentáveis.
Situada na encosta da Serra da Estrela, a Covilhã afirma-se como uma das cidades mais marcantes do Interior de Portugal. É a principal porta de entrada para o ponto mais alto do território continental, guardando nas suas ruas estreitas um património histórico rico. Figuras como Pêro da Covilhã, a antiga Comunidade Judaica e o legado da indústria dos lanifícios, que lhe conferiu o título de “Manchester Portuguesa”, fazem parte da sua identidade. Hoje, essa herança convive lado a lado com um percurso de arte urbana que reinterpreta a cidade.
A Covilhã é uma cidade de espírito aberto, moldada pelo dinamismo da Universidade da Beira Interior, que atrai estudantes de diversas origens e contribui para a renovação do tecido social e cultural. A paisagem montanhosa, o património arquitectónico e uma gastronomia profundamente enraizada nas tradições locais, onde se destacam o pastel de molho, a cherovia e o borrego, são elementos que definem a essência da cidade.
Entre museus, igrejas, miradouros e parques, há muito para descobrir em cada recanto. Os percursos pedestres são uma presença constante, desenhados para quem procura experiências de contacto directo com a natureza, promovendo uma vivência de bem-estar e qualidade de vida.
Desde 8 de novembro de 2021, a Covilhã integra a Rede de Cidades Criativas da UNESCO no domínio do Design, reconhecimento que sublinha a aposta da cidade em colocar a cultura e a criatividade como eixos fundamentais do seu desenvolvimento urbano sustentável.
Aliás, a arte urbana ganhou um lugar de destaque na Covilhã, muito devido ao WOOL – Covilhã Urban Art Festival, criado em 2011. Este é o mais antigo festival de arte urbana em Portugal e foi concebido com o objetivo de reabilitar o espaço público e valorizar a memória e identidade locais através de intervenções artísticas. Os murais, maioritariamente situados no centro histórico, resultam de uma estreita ligação entre os artistas convidados e o património material e imaterial da cidade.
O sucesso do WOOL demonstrou o potencial da arte urbana como ferramenta de transformação comunitária e de valorização turística. A partir daí, outras entidades e coletivos promoveram novas intervenções artísticas noutros pontos da cidade e do concelho, expandindo a oferta e tornando a Covilhã uma referência nesta expressão artística a nível nacional.
Mas a nossa press trip à Covilhã teve também outro motivo: conhecer o hotel Pena D’Água Boutique Hotel & Villas. Instalado num edifício reabilitado, este hotel assume uma ligação profunda com a identidade beirã, conjugando tradição e sofisticação numa harmonia com a natureza envolvente. O nome remete para as antigas medições de água, mas hoje representa um conceito de partilha entre Homem, cidade e montanha.
O edifício principal do Pena D’Água, uma mansão do século XIX que outrora foi casa de família, foi reimaginado com respeito pelas suas raízes e um toque contemporâneo que mantém o charme histórico intacto. A partir daqui, 15 quartos e 4 suítes contam histórias guardadas pelas gerações, enquanto as 8 villas recentes (seis familiares e duas executivas) – inseridas num edifício muito mais recente, com uma construção mais contemporânea e atual, pensadas especialmente para famílias – oferecem vistas panorâmicas e privacidade, unindo o clássico ao moderno num equilíbrio raro. São, portanto, 27 unidades de alojamento ao todo.
O design, como já puderam perceber, equilibra elementos clássicos, como tetos altos e madeiras nobres, com uma decoração atual e funcional, proporcionando um ambiente acolhedor e elegante.
O Pena D’Água adoptou uma abordagem sustentável desde o início do seu projeto. Na reabilitação do edifício, optou-se pela reutilização de materiais, como as vigas de castanho dos antigos telhados, agora transformadas em mobiliário. No SPA, os revestimentos e materiais utilizados provêm de empresas com certificação LEED e incluem elementos naturais como o óleo de linhaça e a cortiça. A recolha de águas pluviais e a instalação de painéis fotovoltaicos reforçam o compromisso ambiental do espaço. Esta preocupação estende-se às atividades propostas aos hóspedes, como passeios de e-quad e aluguer de bicicletas elétricas, proporcionando formas de mobilidade sustentável.
O bem-estar ocupa um lugar central na experiência proporcionada pelo Pena D’Água. O Spa & Wellness – que vai ser aumentado – oferece um circuito de sauna, banho turco e piscinas interiores e exteriores, criando um ambiente de equilíbrio e relaxamento. Os tratamentos baseiam-se em produtos naturais provenientes da serra, proporcionando uma experiência sensorial que alia os aromas da montanha às terapias de água. O ginásio completa esta oferta, assegurando a manutenção do corpo e da mente em sintonia.
Outro dos pontos fortes do hotel Pena D’Água é o Açafrão, localizado no Edifício Arte Nova, também da propriedade. Liderado pelo chef Filipe Madeira, natural da região, o restaurante une tradição e cozinha de autor, realçando a gastronomia local com um toque contemporâneo. Filipe, que regressou à sua terra depois de uma carreira internacional, alia sabores locais a técnicas refinadas, criando um menu que é uma homenagem à região e às suas gentes. E como seria de esperar, a especiaria açafrão, historicamente importante para a Covilhã, está presente em vários pratos, mantendo a ligação às raízes da região.
Ao longo das refeições, os hóspedes são acompanhados pelo cuidado meticuloso do Sommelier Rúben Nunes, também natural da Covilhã, que propõe harmonizações pensadas ao pormenor, valorizando vinhos nacionais com particular destaque para a produção do Douro. A carta de vinhos acompanha a estação e a inspiração do chef, e pode ser apreciada tanto no salão interior como no Atrium by Açafrão, o novo espaço ao ar livre onde os finais de tarde são celebrados entre cocktails e partilhas – mas atenção que este espaço somente funciona durante os meses mais quentes do ano. E claro, há um carta específica para este espaço, mais sazonal, que se rende aos ingredientes frescos e aos sabores mais leves da época.
Como visitámos o Pena D’Água em maio, não foi possível conhecer o Atrium by Açafrão, mas, durante a nossa estadia, pudemos deliciar-nos com propostas como Peixinhos da Horta de Cherovia (raiz muito consumida na região da Covilhã, sendo muito parecida à cenoura, mas mais adocicada), Croquete de Rabo de Boi e Tartelete de Santola (a ideia é comer de uma só vez), nos snacks; com o Pica-Pau de Novilho e o Alho Francês com Manteiga de Cabra, Amêndoa e Coentros (uma opção que nunca saiu da carta, apesar das várias trocas de menu) nas entradas; Feijocas, Sames de Bacalhau e Camarão da Costa (portanto, uma versão sem a típica carne de porco), Lula Nacional com Molho XO e Legumes Grelhados, Bochecha de Vitela, Couve Flor, Espargos e Açafrão, e Presa de Porco Ibérico, Grão de Bico, Aneto e Acelgas nos pratos principais; e sobremesas como a Tijelada Beirã e o Creme Brûlée de Pistachio.
De facto, começa a ser raro encontrar restaurantes como o Açafrão hoje em dia, com tanta qualidade e amor nos pratos. Tradição e inovação é o que nos chega à mesa, naquela que foi, até ao momento, das melhores experiências gastronómicas de 2025. Filipe Madeira e Rúben Nunes têm um futuro brilhante pela frente!
Além das refeições que fizemos no Açafrão, tivemos ainda oportunidade de jantar no magnífico Varanda da Estrela, a menos de 20 minutos de distância de carro. Ali, a mesa é o ponto de encontro onde a gastronomia local, as tradições da Serra e a identidade cultural da região se entrelaçam de forma autêntica. Este é um espaço onde a arte de receber é levada a sério, refletindo-se tanto na escolha cuidada dos produtos endógenos como no ambiente que acolhe os visitantes.
A decoração não é meramente estética; os artefactos típicos da Serra estão ali para contar histórias, criando uma ligação direta ao património local. Mas é na cozinha que o Varanda da Estrela encontra a sua verdadeira essência, apostando numa gastronomia que respeita os sabores tradicionais e que procura, acima de tudo, a satisfação de quem se senta à mesa. E o difícil vai ser mesmo escolher – Tosta Serrana, Feijocas Serranas, Cogumelos Recheados, Arroz de Zimbro do Ti Manel, Pernil Confitado, Javali Guarnecido de Castanhas e Cogumelos Selvagens, Aba de Vitela Assada no Forno da Comadre… No fim, se ainda tiverem espaço, há sobremesas a não perder como a Tigelada Beirã e a Almofadinha Serrana.
Com uma localização privilegiada, o Pena D’Água permite explorar com facilidade o centro histórico da Covilhã e alguns dos seus pontos mais emblemáticos, como a Igreja de Santa Maria Maior, a Ponte de Carrilho da Graça ou o Covão dos Conchos. A proximidade à Serra da Estrela abre ainda possibilidades para percursos pedestres, passeios às praias fluviais no verão ou escapadas à neve no inverno.
Entre a tradição e a modernidade, entre a cidade e a serra, o Pena D’Água afirma-se como um lugar onde a identidade da região encontra novas formas de se revelar. Um hotel que não se limita a acolher, mas que participa ativamente na vida e no património da Covilhã.