O MEO Kalorama tem regresso marcado para 2025, mas as datas ainda não foram divulgadas.
Texto de: Maria João Cavadas; Fotos de: Hugo Moreira
A terceira e última noite desta edição do MEO Kalorama começou, para nós, com uma belíssima surpresa. Obrigados a escolher entre duas bandas no mesmo horário (admitimos que arriscámos passar o concerto de dEUS), foi no palco Lisboa, um palco injustamente negligenciado por muitos, talvez pela menor popularidade dos nomes que ali atuam, que assistimos a um dos melhores concertos do festival.
A atuar pela primeira vez em Portugal e a iniciar uma curta tour pela Península Ibérica, que irá passar por algumas cidades espanholas, os Bandalos Chinos não só surpreenderam quem não os conhecia assim tão bem, como também foram surpreendidos pela energia e o carinho do público. O cativante indie pop da banda argentina não passou despercebido e a peculiar voz e energia do vocalista, Goyo Degano, também não. Não é por acaso que três dos álbuns da banda contam com prémios Gardel, os mais importantes prémios da música argentina. Não sabemos se nos propunham fazer ali uma festa, com “Mi Fiesta” e “Una Propuesta” de El Big Blue (2022), mas foi isso que fizemos. Balançámos com os calmos singles “Departamento”, de 2019, e “Demasiado” de BACH (2018), dançámos com mais vigor com “Súper V” e, já no final, fomos convidados a viajar com “Vámonos De Viaje”. Um concerto que dificilmente esqueceremos e que gostaríamos de reviver.
Era, então, que chegava a hora de ver a estrela da noite. No palco MEO, era evidente a concentração de fãs de RAYE. A carreira da cantora britânica já tem alguns anos, uma vez que são suas muitas composições de outros artistas de renome. Contudo, só mais recentemente se lançou de forma independente – e nós agradecemos. O sucesso de “Escapism”, tema de 2022, nas redes sociais, particularmente no TikTok, catapultou a sua carreira. Pela primeira vez em Portugal, Rachel Agatha Keen conquistou toda a gente. De vestido branco, longo, e acompanhada pela sua banda, com roupa a combinar, RAYE abriu o concerto com “The Thrill Is Gone.”, de My 21st Century Blues (2023), o seu álbum de estreia. Cumprimentou-nos e mostrou-se visivelmente impressionada com a quantidade de pessoas que ali estavam, confessando que não sabia com o que poderia contar na sua estreia em território nacional. Deu-nos a saber que gosta de ter um line-up flexível e que acompanhe a energia do público, pelo que até nos deu a escolher entre dois temas: “Hard Out Here” e “Oscar Winning Tears”. Venceu o segundo.
Foram inúmeros os momentos de discurso da artista, que nos revelou até que, antes de se tornar uma artista independente, fazia música apenas pelo dinheiro. No entanto, um dia, apercebeu-se de que essa não deveria ser a sua motivação, mas sim a honestidade e assuntos relevantes. E, no seguimento disso, cantou-nos “Mary Jane.”, um tema sobre vícios, e “Ice Cream Man.”, que é, na realidade, uma canção que não gosta de cantar, dado o tema sensível do assédio sexual de que foi vítima. A caminho do final, deixando o jazz e os blues de lado, foi com “Black Mascara.” e, claro, “Prada” que nos convidou a dançar num estilo mais rápido e mais energético. Despediu-se do público com “You Don’t Know Me”, tema que gravou com o produtor e DJ Jax Jones e lançado em 2016, e, naturalmente, com “Escapism.”. Entre a sua qualidade vocal perfeita e as confissões que partilhou connosco, RAYE presentou-nos com um dos melhores concertos desta edição do MEO Kalorama e comprovou que está no caminho certo para ser uma das próximas grandes estrelas do mundo da música.
Terminado o espetáculo de RAYE, corremos para o palco San Miguel para ouvir a eletrónica dos Overmono, dos irmãos Tom e Ed Russell. Com o primeiro álbum lançado em maio de 2023, Good Lies, e tendo já colaborado com Fred again.. e Lil Yachty em “stayinit”, os Overmono são, certamente, um nome a reter. Em ascensão no Reino Unido, já com uma extensa fanbase, o duo proporcionou-nos uma hora de música de dança, ainda que os níveis de energia de muitos dos festivaleiros pudesse já não estar em alto nível após tantas horas de festival. O seu set terminou com o seu tema mais popular, “Good Lies”, que conta com uma batida animada e energética.
O festival terminou, para nós, com o concerto de Burna Boy, um dos cabeças de cartaz. Depois do inesquecível concerto de RAYE, difícil de superar, não sabíamos o que esperar. O músico nigeriano, conhecido pelo seu afrobeat, encontraria uma legião de fãs no Parque da Bela Vista. Ainda assim, o entusiasmo parecia ser pouco. Depois de concertos como os de Sam Smith, LCD Soundsystem, Jungle e RAYE, não nos parece exagerado pedir a um cabeça de cartaz um nível de fulgor que ao daqueles se assemelhe. Mas não foi a isso que assistimos. Apesar da tentativa de dar um bom espetáculo, fosse com luzes, imagens, pirotecnia ou algumas dançarinas em palco, Burna Boy ficou aquém das expetativas que se poderiam ter do último artista no palco principal de um grande festival. À nossa volta, mesmo aqueles que pareciam conhecer as suas canções, e que gritavam nas primeiras notas de cada um, rapidamente perdiam a energia. Acrescentamos que o momento mais entusiasmante do concerto se viveu com uma cover: foi com “Jerusalema” de Master KG e Nomcebo Zikode que o público pareceu ganhar algum fôlego, mas rapidamente se voltou ao anterior cenário de tédio. Apesar da sua inquestionável energia em palco, Burna Boy não cativou neste fecho do festival.
Não falam da maior surpresa deste dia, Moonchild Sanelly, que maneira de começar este dia, que energia!
E da maior desilusão, o cancelamento de Soulwax…