God of War é o novo jogo exclusivo para a PlayStation 4, produzido pela Santa Monica Studios, e que traz Kratos de regresso aos ecrãs dos jogadores. Para trás ficou o mundo de deuses da Grécia antiga e o palco é, agora, a terra dos vikings, gigantes e dragões, naquele que é um dos melhores reboots baseado numa série já criticamente aclamada por si só.
O novo capítulo da jornada de Kratos no mundo dos mortais, apesar de não apresentar um número no seu título, é uma continuação dos eventos de God Of War 3 para a Playstation 3.
É logo nos primeiros minutos de jogo que nos apercebemos desta ligação. Kratos apresenta uma farfalhuda barba, uma enorme cicatriz na barriga e está maior, sinais do tempo e da idade que também se fazem sentir nos semideuses.
Não é claro quanto tempo passou, mas sabemos que foi o suficiente para se deslocar para uma nova região e tentar criar uma família.
Agora, num mundo governado por deuses nórdicos, de nomes familiares como Odin e Thor, Kratos tem um novo filho e novas responsabilidades. O passado assombra-o e define as suas decisões, que, entre eles, é treinar o seu filho Atreus a ser um guerreiro, sem lhe dizer o que ele realmente é.
God of War é uma lufada de ar fresco na forma como trata o seu material, desde a apresentação e interpretação de uma mitologia que só nos últimos anos é que começou a ganhar força, ao mesmo tempo que apresenta uma história pessoal, íntima e cheia de emoções fortes. E isto sem nunca descartar os grandiosos e memoráveis momentos que definiram a série.
God of War faz-se ainda acompanhar por uma excecional banda sonora de Bear McCreary, cheia de temas fortes com os cânticos graves que caracterizam a série durante os segmentos mais radicais e agressivos, assim como temas mais suaves e mágicos para aqueles momentos de exploração e contemplação do que estamos a testemunhar.
Ao longo da jornada de Kratos e Atreus, vamos conhecendo tudo o que há para saber sobre as nossas personagens, assim como por que regras são regidas este novo mundo, quer seja por desbloqueio de pontos de interesse, por interações com personagens secundárias ou por conversas que vão acontecendo durante o jogo, deliciosas de se ouvir.
O modo como tudo é contado e assistido está diretamente ligado à apresentação do jogo. Em God of War, a Santa Monica Studios decidiu uma abordagem pouco comum. Mudou a câmara de jogo, passando da câmara estática e distante colocando o jogador no papel de uma entidade observadora e controladora (de um Deus) para uma câmara sobre o ombro de Kratos, ao nível dos seus olhos, com uma perspetiva dos acontecimentos aos olhos de um ser humano. E tudo isto sem nunca cortar.
God of War pode ser jogado na sua íntegra sem nunca cortar o plano de imagem. “Pode” sendo a palavra chave, uma vez que somos apenas interrompidos pelas pausas entre sessões de jogo e pelas idas aos menus. Contudo, a ideia desta possibilidade e o modo como foi executado no seu produto final tornam God of War um dos jogos mais ambiciosos dos últimos anos.
Do ponto de vista narrativo, esta perspetiva raramente nos tira do controlo de Kratos, mesmo nas cinemáticas interativas, dando contornos mais íntimos e humanos à história, particularmente na importante e emocional relação entre pai e filho, e servindo de justificação para deixar no ar o que vai acontecendo em Midgard, longe dos olhos dos nossos protagonistas. Isto acaba por tornar necessário que existam momentos de exposição, que, embora não sejam muitos, são um pouco longos e com demasiada informação para absorver de uma assentada. Todavia, o balanço de informação que nos é dada a cada momento é bastante equilibrado e muito interessante para nos manter focados em God of War durante muitas horas, e considerando a sua extensão, acaba por não ser um problema maior.
E claro, esta perspetiva também influencia a apresentação geral de God of War, desde o modo como as cinemáticas são dirigidas de forma orgânica e fluida na passagem para os momentos de jogo, aos fantásticos visuais que a PlayStation 4 é capaz de produzir.
God of War conta com os melhores gráficos que a PlayStation 4 é capaz. Mesmo na PlayStation 4 Slim, onde se testou o jogo, o nível de detalhe quer nas personagens, quer no ambiente, são absurdos, no bom sentido da palavra. Não há contornos imperfeitos, não há texturas “menos” boas, a iluminação dos ambientes é incrível, as personagens estão extremamente bem detalhadas e credíveis e tudo isto conjuga de forma perfeita com a direção artística do jogo, tornando o produto final em algo que podia ser usado num filme CGI. E se optarmos por jogar sem os elementos de interface (que já são mínimos), é praticamente como se estivéssemos a controlar um longo filme.
É bastante fácil cairmos na tentação de procurar defeitos, mas até aqui teremos dificuldade. Eles existem, mas são raros, muito momentâneos, e não nos retiram da imersão.
É incrível colocar todos estes elementos em cima da mesa e pensar que estamos perante um jogo de mundo semiaberto, que foi outra das grandes alterações face a outros God of War.
Esta nova aventura aposta num jogo que se aproxima do RPG ocidental, com um mundo cheio de áreas abertas para explorar e revisitar. Apesar de o foco ser narrativo, God of War aposta bem forte na exploração. Uma grande porção do jogo será feita de barco a viajar até certos pontos do mapa enquanto ouvimos Kratos a tentar contar histórias e anedotas ao seu filho. Nestes momentos também podemos procurar tesouros e baús, assim como ter acesso a lutas de bosses opcionais e, até, pequenas sidequests.
Tal como a banda sonora ajuda a estabelecer o tom do jogo, o restante áudio tem também um papel importantíssimo na exploração, com sons que nos indicam de que há algo para colecionar, um puzzle para resolver ou um inimigo para abater. O que poderá passar despercebido no início rapidamente nos faz levantar as orelhas à procura de algo novo, sem nunca usar o “modo detetive” que muitos jogos de exploração gostam de implementar.
O áudio, no geral, também é excecionalmente bom, com algum do melhor design de som em jogos. Seja com auscultadores ou com um bom sistema de som, os efeitos de ambiente são envolventes e o som durante as batalhas é definido, encorpado e visceral.
Ao longo do jogo, caberá ao jogador decidir qual é o seu próximo destino, seja continuar na história ou dar uma volta maior de modo a seguir mais preparado para as próximas batalhas. E o melhor de tudo é que este mundo é dinâmico, obrigando-nos a revisitar áreas em alturas diferentes do jogo para aceder a coisas novas. Tal como as personagens, também o mundo em que o habitam vai evoluído. E o melhor de tudo é que poderemos explorar tudo o que é extra depois de completar o jogo.
A exploração acaba, no entanto, por ser quase essencial para o sucesso desta aventura, pois é graças aos itens que encontramos que vamos poder criar e melhorar a nossa armadura e a nova arma de Kratos, o machado Leviathan.
O sistema de melhorias é muito mais denso e complexo do que se fazia prever, mas também não é para se perceber logo do início. A nossa jornada é feita de lições dentro do mundo do jogo e das suas mecânicas. Nada está estabelecido a partir do primeiro momento, o que torna o jogo uma constante novidade de momento para momento, como também nos ajuda a gerir os recursos que vamos colecionando, como moedas e materiais, de modo a construir o set perfeito para o nosso Kratos.
Estas melhorias e alterações nas armaduras e arma também se fazem sentir nas habilidades e movimentos de Kratos e Atreus e cabe ao jogador, mais uma vez, decidir como quer jogar e que tipo de habilidade é que lhe dá mais gozo usar ou é mais eficaz perante certos tipos de inimigos.
Com a nova perspetiva e com este sistema de progressão, a jogabilidade de God of War mudou imenso em comparação ao que a série tinha estabelecido. Ainda que seja possível encontrar alguma familiaridade, tudo é mais contido e pessoal.
O jogador terá que dar uma atenção especial e quase individual a cada inimigo no ecrã, especialmente aos mais fortes, e ter muito cuidado ao dano que leva com os seus ataques que, por vezes, são mortais.
Ao nosso lado teremos Atreus, o filho de Kratos, que, felizmente, não só não é uma personagem irritante, como é bastante útil enquanto extensão das habilidades de Kratos. Também ele tem a sua vestimenta e arma que podemos melhorar, sendo que, durante o combate, podemos indicar para onde e quando disparar, assim como despoletar as suas habilidades únicas. Este controlo também é feito fora do combate ao ajudar na resolução de puzzles e na abertura de novas áreas.
Atreus é controlado pela inteligência artificial, ajudando no combate com alguma independência, mas sem nunca nos tirar a oportunidade de dar a última machadada nos inimigo. Tomara que todos os companheiros em videojogos fossem como Atreus.
Ao controlar Kratos, cada machadada, cada murro, cada ação tem um impacto impressionante mesmo jogado sem som (o que é um crime), sendo possível testemunhar a violência desses momentos. O modo como a câmara se move em ações finais ou ataques especiais é sublime e envergonha grandes produções cinematográficas. O combate é excitante, viciante e sabe muito bem.
Isto é especialmente notório nas batalhas com bosses ao longo do jogo, que, dependendo do ambiente e do ponto da história, apresentam batalhas dinâmicas e com uma escala que não se imaginava possível no início desta aventura.
God of War é uma agradável surpresa no modo como a série se transformou e o resultado final roça a perfeição. Apesar de pequenos bugs e de algumas situações de fazer torcer o nariz, é no geral tudo aquilo que se pede num videojogo. É longo, cativante, dinâmico e moldável ao estilo de jogo do jogador, joga-se bem e é extremamente belo.
É também um raro exemplo do que é possível neste meio dada a liberdade e valores de produção necessários para representar a visão e ambição dos artistas envolvidos em produtos deste género. É nos pequenos detalhes, no ritmo da jornada e até nos elementos dedicados aos fãs, que é possível testemunhar o carinho e respeito que a Santa Monica Studios tem pelos jogadores. E o resultado vale bem a pena. É um título obrigatório para quem tem uma PlayStation 4 e pode ser até a razão para adquirir uma.
God of War é uma jornada emocionante com momentos de arrepiar e de nos deixar com o queixo no chão, imensas surpresas e reviravoltas, e com algumas das melhores cenas de ação desta geração. Um jogo com todos os ingredientes para se tornar num exemplo a seguir na indústria dos videojogos.
God of War chega em exclusivo à PlayStation 4 e PlayStation 4 Pro no dia 20 de abril.
God of War
Nota: 10/10
Este jogo foi cedido para análise pela PlayStation Portugal.