Para lá da premissa básica e cheia de clichés, a divertida mobilidade inspirada em parkour para fugas emocionantes e o combate quase tático para desmembrar zombies, tornam Dying Light: The Beast num jogo tão divertido como um filme de ação de domingo a tarde.
Sempre olhei para a série Dying Light um pouco à distância. Experimentei os dois jogos principais por curiosidade quando foram lançados, mas nunca cheguei realmente a investir horas suficientes na sua proposta de jogo de ação na primeira pessoa, com elementos RPG, passado em mundos pós-apocalípticos com zombies, ao mesmo tempo que também arriscava numa jogabilidade fluida, inspirada em parkour e jogos muito acarinhados como Mirror’s Edge. Apesar deste seu conceito interessante, que convenceu satisfatoriamente críticos e jogadores, nunca fiquei realmente fã, mas muito por uma questão pessoal: o lado de terror da série. Não se trata de um género qualquer, mas exatamente esta aposta num mundo pós-apocalíptico com zombies e todas as suas tropes narrativas e mecânicas, como o vírus que contamina tudo e todos, as ruas povoadas por mortos-vivos e as temáticas de “quem é o verdadeiro monstro” que me cansam.
Ainda assim, decidi abrir-me a novas experiências e ir além desta aversão pessoal, muito pela receção calorosa da série Dying Light. The Beast surge como uma oportunidade para me convencer porque parece ser um best-of dos dois jogos anteriores e ainda assim – apesar de ser canónico aos mesmos -, conseguir funcionar como uma nova porta de entrada, não só para mim, como para novos jogadores da série.
Situado após os eventos de Dying Light 2, Dying Light: The Beast é, na verdade, uma sequela direta do jogo original, mais precisamente da expansão The Following, trazendo de volta Kyle Crane às mãos do jogador. Após anos de tortura nos laboratórios do Barão, onde foi sujeito a terríveis experiências, Crane passa de cobaia a força da natureza, ao adquirir uma série de poderes dos quais teremos que tirar partido para fugir às hordas de zombies, derrotar Quimeras, evoluir os poderes e vingar-nos do Barão. E o jogo até faz um excelente trabalho a apresentar-nos do que se trata a sua história e de onde vem, com um belo resumo inicial.

A premissa é tão simples que a sua história serve apenas de pano de fundo para o jogo, com uma escrita básica, mas eficaz, textos e diálogos cheios de clichés, personagens saídas de bandas desenhadas e um vilão que é mau sem justificações dos seus atos, que encaixaria na perfeição num filme de 007. Apesar de não ser nada de por ai além, ao longo do jogo é impossível ficar indiferente à jornada de Crane e à sua personalidade resmunguenta, de quem definitivamente não quer estar ali, mas tem que sobreviver mais um dia com a nossa ajuda. Acaba por ter o seu charme.
Dying Light: The Beast transporta-nos até uma nova localização, Castor Woods, uma fictícia região montanhosa europeia, com uma apresentação mais rural e ambiental em relação aos jogos anteriores, contrastando especificamente com os arranha-céus abandonados e vertiginosos de Dying Light 2. Não quer assim dizer que a verticalidade não exista em Dying Light: The Beast, antes pelo contrário, com o jogador a ter que navegar pelo topo de prédios, mansões e igrejas, balançar entre ramos de árvores e até saltitar por regiões mais rochosas. O parkour continua assim a ser uma peça importante no puzzle da sua jogabilidade, tanto para a navegação do jogo – que inclui também veículos -, como de forma defensiva quando a fuga de infetados é a solução, sendo que estes momentos são os pontos mais altos da experiência Dying Light: The Beast – especialmente quando a noite cai e apenas a lanterna nos guia pelos telhados enquanto criaturas raivosas nos perseguem intensamente.
Diz-nos a Techland que tentou afinar o seu sistema de combate para ser divertido e visceral, ou, como quem diz, satisfatórios. E de facto sente-se que há aqui algo de interessante, não só em relação aos jogos da série, mas a outros jogos na primeira pessoa deste género, com uma dualidade bem distinta entre o uso de armas de tiro, com arremeção de armas brancas, canos e outros objetos. É uma dinâmica que muda por completo a forma como abordamos cada combate e gerimos também o nosso arsenal. Da mesma forma que armas de fogo ficam sem munições, um machado, martelo ou machete também conta com limites, algo que inicialmente se revelou frustrante quando entrei no jogo para bater em todos os inimigos que me apareciam na frente, esquecendo-me que fugir e gerir o arsenal é sempre também uma opção – por vezes a melhor.

Mas a minha opção de começar a bater nos inimigos logo de início também me ajudou a encontrar a satisfação prometida do combate, até porque há uma pequena curva de aprendizagem na sua dança e a distância de ataque dos inimigos, que não é imediatamente clara, levando-me a ser consumido por zombies famintos muito rapidamente. Há um claro perímetro de distância que deve ser mantido dos zombies e um jogo de movimentos bem trabalhado entre desvios precisos e ataques poderosos, com os quais também é preciso equacionar uma barra de stamina que vai-se gastando aos poucos – algo que, pessoalmente, poderia ser removido de todo, como felizmente fizeram na vertente do parkour.
Esta dança de ataque e desvio também é motivada pelo nível de “besta”, uma das novidades do jogo, um novo modo que funciona como uma espécie de “hulking out” e que faz justiça ao nome do jogo, destruindo tudo e todos com o poder do punho. Inicialmente esta habilidade é ativada de forma automática, mas quanto mais evoluímos Crane, mais possibilidades de uso se abrem.
Um dos aspetos que torna o combate de Dying Light: The Beast tão satisfatória é a forma como os zombies se desfazem, seja no combate mais corpo a corpo, com lâminas ou com armas de tiro, e perdem pedaços de carne, saltam membros e rebentam de forma extremamente divertida e dinâmica, o que acaba também por incentivar a interação com os inimigos.
Dying Light: The Beast também é suportado por uma ótima direção artística e visuais bastante interessantes e ricos, destacando-se pelo ambiente urbano, com arquiteturas complexas, cheio de detalhe acentuado pelo desgaste do tempo ao abandono humano. O sistema de iluminação global ajuda a apresentar resultados extremamente convincentes e dignos de fotografar e guardar num álbum de viagem, mas este é um efeito que não perdura o jogo todo, com cenários interiores e a apresentação de personagens a remeterem para visuais de gerações de jogos mais antigos. Há definitivamente uma certa jank aqui e ali, mas nada que nos retire do jogo.

Onde o jogo se torna realmente aborrecido é na vertente mais RPG, em particular na gestão de itens, crafting e até na navegação nos menus. Os templates são básicos e as mecânicas de personalização e gestão saturam com aqueles sub-objetivos de adquirir um determinado número de itens e elementos para evoluir as armas e equipamento. São coisas genéricas e banais em jogos modernos com veia para a “sobrevivência” temática aqui presente, que ao longo do jogo acabam por comprometer o ritmo, até porque o desgaste do equipamento e, por vezes, a falta de recursos essenciais são fatores a ter muito em conta.
Apesar destes pequenos apontamentos, Dying Light: The Beast revelou-se um jogo bem mais divertido do que estava à espera,quebrando aquela barreira original das primeiras horas que me fizeram saltar do barco em jogos anteriores. A divertida exploração com recurso ao parkour, a opção de escolha entre combate e fuga em momentos mais críticos e próprio combate dinâmico e ativo, foram o suficiente para me deixar ficar por Castor Woods mais tempo, mesmo sem grande urgência em vingar-me do trauma de Kyle. Dying Light: The Beast não irá, certamente, ser vencedor de muitos prémios, mas tem a promessa de diversão, ação e catarse certas para entreter sem termos que pensar muito.
Cópia para análise (PC) cedida pela Best Vision PR.