Castor europeu regressa a Portugal após cinco séculos de ausência

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Mais de 500 anos depois da sua extinção em território nacional, o castor europeu foi avistado em Portugal.

Após uma ausência que se prolongou por vários séculos, o castor europeu (Castor fibre) regressou a território português. A confirmação surge na sequência de acções de monitorização realizadas pela Rewilding Portugal numa zona de fronteira com Espanha, onde foram identificados sinais claros da presença desta espécie. O seu reaparecimento representa não apenas o regresso de um mamífero outrora extinto localmente, mas também um dos avanços mais significativos no esforço de recuperação ecológica dos ecossistemas ribeirinhos portugueses.

O último registo fiável de castores em Portugal remonta, ao que tudo indica, ao final do século XV. Desde então, a espécie desapareceu do território nacional, resultado direto da caça intensiva e da destruição dos seus habitats naturais. No entanto, após mais de duas décadas de recuperação populacional em Espanha, começaram a surgir indícios da sua aproximação ao território português. Ao longo de várias ações de monitorização, a equipa da Rewilding Portugal foi detetando marcas características de atividade de castores, nomeadamente troncos roídos e alterações na estrutura dos cursos de água. A instalação de câmaras de foto-armadilhagem acabou por confirmar a presença de um jovem adulto já do lado português da fronteira.

O castor europeu é amplamente reconhecido como um verdadeiro engenheiro de ecossistemas. O seu comportamento instintivo – a construção de barragens, escavação de canais e remodelação das margens dos rios – provoca alterações profundas na paisagem, promovendo o aumento da biodiversidade, a retenção de água e a criação de habitats mais complexos e resilientes. Ao criar zonas húmidas e áreas de água parada, as suas estruturas favorecem uma ampla variedade de espécies, incluindo anfíbios, insectos aquáticos, aves, peixes e pequenos mamíferos. Estas zonas funcionam ainda como filtros naturais, reduzindo a quantidade de sedimentos e poluentes na água, travando o escoamento superficial e contribuindo assim para a mitigação de cheias e erosão.

Além disso, ao elevar o nível da água nas margens, os castores aumentam a retenção hídrica no solo, uma função particularmente relevante em contextos de seca prolongada e desertificação, fenómenos que se têm tornado mais frequentes em várias regiões do interior português. Há também evidência crescente de que as áreas húmidas criadas pelos castores atuam como barreiras naturais à propagação de incêndios florestais, mantendo zonas permanentemente húmidas que dificultam o avanço do fogo e oferecem abrigo a inúmeras espécies durante os períodos críticos.

Segundo Pedro Prata, líder da equipa da Rewilding Portugal, os serviços ecológicos prestados pelos castores são incomparáveis e não podem ser replicados com o mesmo grau de eficácia por meios artificiais. O castor europeu melhora a qualidade da água, cria refúgios para outras espécies e ajuda a mitigar fenómenos extremos como a seca e os incêndios, sem necessidade de grandes investimentos nem intervenções técnicas complexas.

Nos últimos anos, o conceito de rewilding tem ganho destaque como abordagem sistémica de restauro ecológico, baseada na reintrodução de espécies-chave que restauram os processos naturais. O castor europeu é um dos melhores exemplos desta filosofia em prática. O seu regresso espontâneo a Portugal é uma oportunidade concreta para aplicar os princípios do rewilding funcional, permitindo à natureza recuperar o seu papel nos ecossistemas e devolvendo vitalidade a paisagens actualmente empobrecidas, artificializadas e vulneráveis.

A presença do castor europeu, contudo, levanta também questões práticas. A sua atividade pode ter impacto em plantações ribeirinhas ou infraestruturas mal adaptadas às dinâmicas naturais dos rios. No entanto, a experiência de vários países europeus demonstra que a coexistência é não só possível, como desejável, desde que acompanhada por medidas de mitigação simples e acessíveis. Na Suécia, por exemplo, foram criados programas de compensação financeira para proprietários afetados por inundações provocadas pelas barragens dos castores. Na Alemanha, surgiram mediadores especializados, os chamados Beaver Managers, responsáveis por implementar soluções técnicas como a instalação de tubos reguladores em diques ou barreiras de proteção junto a áreas agrícolas. Estas abordagens têm sido também adoptadas na Suíça e em França, onde foram ainda desenvolvidas campanhas de sensibilização e materiais educativos sobre a importância da espécie e formas de lidar com eventuais conflitos.

Em Portugal, a Rewilding Portugal decidiu divulgar publicamente a descoberta e informar atempadamente as autoridades competentes, apelando à criação de um plano preventivo de resposta, baseado no diálogo com as comunidades locais e na antecipação de possíveis desafios. Até ao momento, essa proposta não teve seguimento nem gerou qualquer iniciativa oficial. Apesar disso, o trabalho de monitorização prossegue, a presença do castor europeu está confirmada e ainda há tempo para garantir que a sua integração no território decorre de forma harmoniosa e benéfica.

Foto: Rewilding Portugal

Alexandre Lopes
Alexandre Lopeshttps://echoboomer.pt/
Licenciado em Comunicação Social e Educação Multimédia no Instituto Politécnico de Leiria, sou um dos fundadores do Echo Boomer. Aficcionado por novas tecnologias, amante de boa gastronomia - e de viagens inesquecíveis! - e apaixonado pelo mundo da música.
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