Foi um dia bem diversificado no Primavera Sound Porto 2025. Hoje, terceiro dia do evento, há nomes como Parcels e Jamie XX, entre outros, para escutar.
Hoje não há marés dominantes a caminho do Parque de Cidade. Alguns restos de coleção de Fontaines D.C., uma sessão vestida a rigor para Deftones, mas tudo bem diluído no meio da azáfama daquele que é um dia de trabalho normal no Porto e em Matosinhos.
Dá-se assim o mote para aquele que se prevê um dia bem mesclado em termos de públicos no Porto Primavera Sound. A primeira tranche a ser servida é a dos fãs do indie artístico tão em voga há década e picos atrás dos TV On The Radio. Com um hiato de dez anos desde a última vez que os vimos, tempo em que vários projetos a solo e até carreiras de ator surgiram entretanto, há alguma curiosidade para perceber a forma dos de Brooklyn neste regresso.
Embora o som no início não esteja o ideal (coisa rara nesta edição), alguma distorção nos instrumentos entretanto minimizada, rapidamente se percebe que a resposta é sim, estão de boa saúde. Com Tunde Adebimpe e as barbas de Kyp Malone a liderar as hostes, vai-se trunfando boas cartas do repertório, com “Young Liars” à cabeça, passando por “Dreams”, e “Wolf Like Me”. Num alinhamento muito pontuado com contacto com o público a mencionar as mensagens políticas da etiqueta atual americana, e que incluiu um “Parabéns a Você” ao baterista Jahphet Landis. Ponta final a chegar com a inevitável “Happy Idiot” e final feliz com “Staring at the Sun” neste fim de tarde no plano Vodafone. Prova de vida e feita, e uma tournée de sala daqui a uns tempos não ficaria nada mal, pela reação dos fãs.
Dali a pouco, no distante palco Porto, o inglês Michael Kiwanuka começa o seu concerto. Aqui é outro canal que se encontra sintonizado, o de uma soul quente, melódica, fortemente espiritual. Com incontáveis músicos em cena, num palco que já várias vezes serviu para apenas para cena de estrelas solitárias, o vencedor do Mercury Prize tratou de forma séria mas calorosa o desafio de tocar num festival de massas. O público respondeu com respeito, mesmo quem queria estar na conversa fazia-o de forma mais respeitosa e calma que o habitual. O comportamento coletivo é uma coisa engraçada. No meio da calma existiu também agitação, em forma de bateria como em “Hero” ou de mensagem com em “Black Man in a White World”. Lição em com é possível fazer bonito com profundidade sem cair em slogans.
Não há que negar que hoje o coração balança para Beach House, das poucas exceções à promessa de procurar a novidade ao vivo este ano. Não há maneira de passar ao lado de Victoria Legrand e Alex Scally, não obstante o interessante projeto de Liniker, uma das coqueluches brasileiras do momento, mesmo ali ao lado (e com alguns ligeiros casos de cruzamento de som). Simplesmente, não há nada parecido àquela aura celestial que emerge do escuro como breu. Aliás, a escuridão foi o tema principal durante os desfile de 12 músicas, que se iniciou com as teclas sintéticas de “Lazuli”, som que depois de ouvir não se esquece, passando depois para “Dark Spring”, “Silver Soul”, até chegar à antológica “PPP”, voz de Victoria como sempre e como não queremos nunca que deixe de ser.
Há focos muito simples de luzes nas telas, e a iniciar a viragem para o fim há o arrepio de “Myth”, e pouco depois a estalada na cara mais suave do mundo de “Space Song”. Só os Beach House nos conseguem elevar desta forma. Prestação inatacável.
Numa 6ª feira em que se está sempre a alterar radicalmente de registo, é preciso parar para absorver. Tempos depois, passagens para morder o ambiente em Central Cee, rapper britânico que parecia estar a animar convenientemente a galera, e pelo final curiosíssimo dos Chat Pile, onde a força do noise rock dos americanos vai enchendo a secção da colina do palco Super Bock. Raygun Busch, vocalista de calções e tronco nu bem na linha do furacão David Yow dos Jesus Lizard (estrelas na madrugada da primeira noite) estava visivelmente comovido com a receção, descrevendo este como um “quite a special show”, e que no Oklahoma não há nada assim. Pede para termos orgulho no festival e o tratarmos bem. Assim seja.
A caminho da saída, tempo ainda para saborear o início do tão falado regresso do Deftones. E embora longe dos nossos meridianos de preferência, não há que negar que a amostra ouvida de Chino Moreno e companheiros, com pilares de luzes e muita projeção de tempestade em palco, passou a sensação de estarem em ótima forma, cilindros todos a carburar.