IMO aprova nova área de controlo de emissões no Atlântico Nordeste.
Uma decisão tomada na semana passada em Londres poderá marcar um ponto de viragem no combate à poluição atmosférica provocada pela navegação marítima ao largo da costa portuguesa. O Comité de Proteção do Meio Marinho da Organização Marítima Internacional (IMO) aprovou a criação de uma nova Área de Emissões Controladas no Atlântico Nordeste, resultado de um esforço coordenado por Portugal e apoiado por vários países europeus, com a participação ativa de organizações não-governamentais e instituições académicas.
Este novo espaço de controlo abrangerá uma vasta zona marítima, que se estende pelas águas adjacentes de Portugal, Espanha, França, Reino Unido, Irlanda, Ilhas Faroé, Islândia e Dinamarca (incluindo a Gronelândia). A decisão insere-se num movimento mais alargado de regulação das emissões provenientes do setor marítimo, articulando-se com zonas semelhantes já em vigor, ou em vias de o estar, no Mar do Norte, Báltico, Mediterrâneo, bem como em águas canadianas e do Árctico.
As Áreas de Emissões Controladas obrigam os navios a operar com combustíveis de baixo teor de enxofre – não superiores a 0,1%, quando o limite atual é de 0,5% – e a adotar tecnologias que permitam reduzir de forma significativa as emissões de óxidos de azoto e partículas finas. Estima-se que, com esta medida, se consiga uma redução de 82% nas emissões de óxidos de enxofre, de 64% nas partículas PM2.5 e de 36% no chamado carbono negro, um poluente com impacto direto no aquecimento global e na saúde humana. Também se antecipa uma queda acentuada nas emissões de óxidos de azoto até meados do século, à medida que novas embarcações forem obrigadas a incorporar sistemas de controlo específicos.
Os ganhos ambientais e sanitários são expressivos. A nova regulação poderá evitar entre 2.900 e 4.300 mortes prematuras até 2050, além de permitir uma poupança estimada entre 19 e 29 mil milhões de euros em custos associados a doenças respiratórias e cardiovasculares causadas pela má qualidade do ar. A medida contribuirá ainda para a redução do risco de derrames de combustíveis pesados, altamente nocivos para os ecossistemas marinhos.
No caso português, mais de 50.000 embarcações atravessam anualmente a Zona Económica Exclusiva, que ficará agora abrangida por esta nova área de controlo. Os ventos predominantes de noroeste transportam os poluentes emitidos ao largo para a faixa litoral e para o interior da Península Ibérica, com efeitos comprovados na saúde pública e no ambiente.
A proposta aprovada resulta de um processo iniciado em 2020. Em Portugal, coube à Direcção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos a condução do trabalho técnico e diplomático. O país assumiu a liderança da proposta submetida à IMO em nome da União Europeia e dos restantes Estados costeiros.
A ZERO, tal como outras organizações da sociedade civil, teve um papel determinante ao longo de todo o processo. Contou com o apoio da organização alemã NABU e da Fundação Oceano Azul, tendo sido realizadas várias iniciativas conjuntas ao longo dos últimos anos. Os contributos técnicos foram assegurados por entidades como o Conselho Internacional de Transportes Limpos (ICCT) e a Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. A aprovação formal deverá ocorrer numa sessão extraordinária do mesmo comité, prevista para outubro de 2025, sendo a entrada em vigor da nova área esperada para março de 2027.
Apesar deste avanço, as Regiões Autónomas de Portugal continental ainda não estão incluídas na nova área. A ZERO já anunciou que continuará a trabalhar com os governos de Portugal, Espanha e Marrocos com vista à sua expansão para os arquipélagos dos Açores, da Madeira e das Canárias. Um estudo técnico demonstrou que 94% do tráfego marítimo que atravessa estas ilhas tem como origem ou destino outras áreas já sujeitas a controlo de emissões, o que reforça a viabilidade da sua inclusão, ficando pendentes apenas questões de natureza política.
Foto: ZERO