Monster Hunter Wilds representa uma evolução tímida, mas lógica, da saga, servindo como um excelente ponto de entrada para novos jogadores graças a uma campanha robusta, acessível e relativamente curta. No entanto, corre o risco de ser “o suficiente” para muitos, tornando-se também uma barreira à sua verdadeira forma no pós-jogo.
Se tivesse de definir rapidamente Monster Hunter Wilds com uma palavra, seria “fácil” ou “curto”. Termos que normalmente podem ser vistos como negativos, mas que se revelam qualidades positivas quando consideramos a direção tomada pela Capcom para tentar atrair um público mais abrangente, numa série que, para quem não a conhece, pode ser intimidante.
Eu próprio fiz parte desse grupo de jogadores, só descobrindo o que Monster Hunter tinha de especial em Monster Hunter World e, mais tarde, no fantástico, mas mais refinado, Monster Hunter Rise. Não foi, admito, uma curva de aprendizagem fácil ou intuitiva, e demorei dezenas de horas até me tornar num caçador proficiente. Mas foi nesse processo que aprendi as nuances da série: a profundidade das mecânicas, a gestão de equipamentos e consumíveis e a forma de navegar pelo mapa, interpretando toda a sua iconografia para otimizar cada caçada.
Tudo isto faz parte do ADN da série e continua presente em Monster Hunter Wilds, mas um primeiro contacto mais direto e exigente com todos os seus sistemas não é a forma mais apelativa de apresentar o jogo a novos jogadores.
Por isso é que “fácil” ou “curto” são, para mim, excelentes cartões de convite para explorar esta nova aventura da Capcom, que atira os jogadores para o meio da ação, com maior controlo, e que nos dá as mãos para compreender os seus objetivos basilares, e ainda com uma flexibilidade bem-vinda para recordar os veteranos de como se joga e com espaço suficiente para brincar.
Monster Hunter Wilds é, claramente, o jogo mais cinemático, inicialmente linear e de maiores produções da série, até à data. Trata-se de uma evolução natural e orgânica não só do que a indústria oferece, como do que a série pode ser, apresentando uma campanha mais focada, com uma história sólida e um elenco de personagens cheias de vida e de charme para conhecer e interagir, à medida que vamos explorando um novo mundo, dividido em biomas conectados, recheados de criaturas espetaculares para deitar abaixo.
A campanha introduz também um novo ângulo no papel do caçador, com burocracias e um sentido de honra a condicionar as caçadas. Não entramos em Monster Hunter Wilds para desbravar o ambiente e caçar tudo o que encontramos à frente. Se há uma caçada, há um propósito, sendo o maior deles todos o controlo do equilíbrio natural daquele mundo. Não podemos caçar um monstro sem autorização da Handler, e há um peso narrativo significativo no momento em que recebemos o aval para eliminar uma criatura. A ideia de estudo e exploração da fauna já existia em jogos anteriores, mas nunca foi tão bem integrada, ainda que, na prática, todas as missões da campanha acabem por culminar em batalhas onde os monstros morrem ou são enxotados.
Apesar de a história não ser particularmente inovadora ou cativante – e até se tornar um obstáculo para jogadores veteranos –, serve bem para introduzir as regras do jogo e acompanhar a progressão gradual da dificuldade. O ritmo é bem definido, com pouca exploração e uma progressão controlada, quase de nível em nível, afastando-se do modelo mission based tradicional da série.
Com muitos tutoriais pelo caminho e algumas sequências on rails, a campanha faz-se acompanhar de fantásticas e emocionantes cinemáticas, como já comentei, extremamente bem dirigidas, com muitas oportunidades de podermos observar o nosso Hunter a ser altamente badass com as sua aparências e armaduras personalizadas, e até com voice acting para podermos ouvir incríveis one-liners e, claro, criar uma maior interação mais urgente entre as personagens que nos acompanham.
Parte da facilidade do jogo concentra-se precisamente neste modelo de campanha e da tentativa de tornar Monster Hunter Wilds mais “acessível”, linear e focado, com um nível de desafio mais contido, resultando em caçadas mais rápidas, menos desafiantes e, até, menos frustrantes. Ao longo das minhas 22 horas, tempo necessário até ver os créditos, apenas falhei uma missão por perder as tentativas todas. Pois para além de todas as qualidades já descritas, o sistema de SOS e de pedido de ajuda de outros jogadores e/ou NPCs também alivia qualquer frustração.
E admito que recebo este lado mais linear e relaxado de Monster Hunter Wilds de braços bem abertos, pois apesar de tudo isso, a experiência e a alma da série revelam-se com os seus mecanismos familiares e complexos no que toca ao desbloqueio e atualização de equipamentos, à gestão de consumíveis e, até, à própria jogabilidade do jogo, com todas as suas diferentes abordagens de combate, dependendo da escolha de armas do jogador. Monster Hunter Wilds continua assim a ser um poço profundo de leitura de menus e de minicursos, através de tutoriais in-game e, por vezes, da comunidade, que costuma ser mais clara com “coisas que o jogo não nos diz” – coisas essas que se resumem simplesmente a alterações de definições, revelando assim uma extensa lista de melhorias de qualidade de vida (QoL Features) muito bem-vindas para o jogo.
Mas a verdadeira experiência de Monster Hunter Wilds começa após os créditos, quando o jogo adota um formato mais próximo do tradicional, já mais opcionais e mission-based, de acordo com o nível do jogador e na necessidade de obter materiais específicos para fabricar novas armaduras e melhoramentos.
Apesar de tudo, admito que Monster Hunter Wilds não me deixou tão enamorado como as duas últimas apostas da saga. Mesmo com o maior foco, polimento mecânico e dos claros valores de produção mais elevados que tanto aprecio, esta jornada inicial não se revelou tão desafiante ou espetacular como algumas caçadas ao Rathalos nas cascatas das selvas de Monster Hunter World, ou das épicas batalhas com o Legiana no topo das Coral Higlands – também no mesmo jogo -, ou das viscerais lutas com o Magnamalo em Monster Hunter Rise, monstros esses que surgem relativamente cedo nos respetivos jogos e que impõem o devido respeito, requerendo exploração e estudos aprofundados para o sucesso dessas caçadas.
Os ambientes também não se revelaram particularmente muito interessantes de explorar, não só por causa de segmentos on rails que nos levavam ao objetivo seguinte à medida que fazíamos turismo virtual, como também não os senti tão diversos e distintos como em jogos anteriores. Fator redentor é que, desta vez, estão todos interligados num único “mundo”, algo que ajuda bastante na exploração pós-campanha.
Outro aspeto menos satisfatório foi a apresentação técnica. Mesmo na PlayStation 5 Pro, foi necessário algum tempo para me habituar a certos compromissos visuais em prol do desempenho. O jogo oferece três modos gráficos – Desempenho, Qualidade e Equilibrado –, com taxas de 60 FPS, 30 FPS e 40 FPS (em ecrãs compatíveis), e suporte para Ray-Tracing nos modos Qualidade e Equilibrado. No entanto, o modo Qualidade apresenta texturas de baixa resolução, como se o jogo tivesse dificuldades em carregá-las corretamente, enquanto o modo Desempenho sofre de artefactos visuais e instabilidade em certas situações.
Ao terminar a campanha, senti que já tinha tirado o máximo proveito do jogo, mesmo sabendo que o conteúdo mais desafiador só surge depois. Foi mais um treino, um curso introdutório a Monster Hunter, do que propriamente um jogo completo – um pouco como as campanhas de Call of Duty, que preparam os jogadores para o verdadeiro foco da experiência, o multi-jogador.
E talvez por causa disso, a minha urgência em continuar a explorar o seu mundo e a evoluir a personagem dissiparam-se rapidamente. Talvez regresse em breve, já com outra mentalidade e vontade em continuar a aventura em busca de novos recursos para armas mais incríveis e, até, para sessões sociais com amigos e desconhecidos, pois no final do dia, a essência de Monster Hunter parece estar toda cá.
Cópia para análise (versão PlayStation 5) cedida pela Ecoplay.