Inspirado em animação stop-motion, The Spirit of the Samurai cola-se em demasia às suas inspirações, sem se destacar por algo particularmente único, além dos seus problemas e das mecânicas mal afinadas.
Quando The Spirit of the Samurai foi inicialmente revelado no ano passado, fiquei encantado com a sua apresentação. Esta aposta da Digital Mind – estúdio espanhol de animação 3D – não é a primeira neste meio interativo, mas é provavelmente a mais ambiciosa desta equipa, que conta com um portfólio composto por projetos para dispositivos móveis de qualidade duvidosa.
The Spirit of the Samurai apresenta-se como um jogo de ação 2.5D, no formato side-scroll, misturando elementos de metroidvanias com uma pitada de souls, que nos leva até um mundo de samurais e dos horrores da mitologia japonesa, onde navegamos por níveis no mundo real e noutros planos da realidade, habitados por criaturas horripilantes. Ao longo desta jornada, controlamos três personagens: Takeshi, o samurai titular; Kodama, um pequeno espírito; e Chisai, um adorável gatinho guerreiro, que vão trocando de protagonismo à medida que avançamos na história.
Apesar do seu ambiente e influências, o que realmente atrai em The Spirit of the Samurai é o seu conceito e direção artística, inspirados em animações stop-motion, como mencionado nos press releases, referindo o clássico Jason and the Argonauts, de 1963, ou o incrível Kubo and the Two Strings, do estúdio LAIKA.
Se há algo que devo gabar em The Spirit of the Samurai, é que cumpre bem a promessa de entregar uma experiência visualmente próxima de uma animação stop-motion, particularmente durante a jogabilidade. Vou mais longe, destacando um pequeno sentimento de nostalgia por jogos da era 16 e 32-bit, onde era comum encontrarmos jogos visualmente baseados em sprites com animações de baixo frame-rate. É uma sensação estranha, que resulta particularmente bem em The Spirit of the Samurai, graças à enorme quantidade de animações dos nossos personagens e dos inimigos, que fluem graciosamente de acordo com a dança do combate.
Infelizmente, os meus elogios a The Spirit of the Samurai terminam aqui. Apesar das boas intenções e ambições da Digital Mind, este jogo sofre das armadilhas das suas inspirações — que são excessivas — e de uma falta de polimento técnico que me impediu de continuar a minha aventura: um bug bloqueou por completo o progresso, com o jogo a não apresentar uma prompt de interação necessária para continuar. Uma situação que foi a cereja no topo de um bolo cheio de arestas e frustrações.
Até então, o jogo já me deixava particularmente irritado e confuso sobre o que queria ser, mesmo ignorando a péssima navegação nos menus e as limitadas opções disponíveis. Começando por este elemento, é estranho e lamentável que um jogo que demonstra algum talento em direção artística falhe tão redondamente na sua interface barata, difícil de ler e de navegar, reduzindo em muito a qualidade superficial do jogo.
O mesmo se pode dizer dos trechos cinemáticos, que, apesar de sua estética e registro animado, não entregam a mesma sensação de stop-motion aplicada no jogo em si. Com vídeos pré-renderizados, de uma qualidade de imagem que parece saída de jogos da geração 128-bit, as animações são rígidas e a direção das cinemáticas apresenta-se extremamente amadora, com cortes estranhos e escolhas de planos que denigrem a ótima direção artística do jogo. Tudo muito estranho, considerando a experiência do estúdio em animações 3D.
O jogo em si também não me encantou. A jogabilidade nem sempre é responsiva aos comandos, e a natureza de The Spirit of the Samurai agrava esse problema por decisões como o gasto agressivo de stamina nas primeiras horas de jogo, incluindo ao correr. The Spirit of the Samurai apresenta-se inteiramente como um side-scroller, com as personagens a navegarem lentamente (porque correr gasta stamina) e com indicadores pouco legíveis para entrar noutras partes dos níveis, tornando a navegação extremamente aborrecida quando andamos em círculos a procura do próximo objetivo.
A veia souls prende-se particularmente à ideia de que “basta ser difícil” para oferecer desafio. Felizmente, The Spirit of the Samurai não é propriamente um jogo muito difícil, mas há cenários em que se revela demasiado imperdoável, com o surgimento de demasiados inimigos na tela, que ora morrem com um toque, ora requerem uma quantidade elevada de golpes para serem derrotados. Os controlos, que por vezes falham ações, não ajudam.
The Spirit of the Samurai também aposta imenso em qualidades de RPG, com um profundo sistema de personalização de ataques e de movimentos, uso de itens e alocação de pontos como “vida”, “força”, “energia”, entre outros, que podem resolver muitas destas frustrações ao longo do tempo. Mas, lá está, requerem paciência por parte dos jogadores, um aspeto que, no meu caso, se esgotou rapidamente ao perceber que, para avançar, teria que recomeçar esta aventura.
Existem boas ideias e conceitos em The Spirit of the Samurai, e é clara a paixão pelas suas inspirações, especialmente visuais. Mas, enquanto jogo, mistura demasiados elementos familiares e não só tem dificuldade em destacar-se de forma única, como apresenta demasiadas falhas e elementos que se esperariam encontrar mais num projeto académico.
The Spirit of the Samurai está atualmente disponível no PC via Steam, onde poderão encontrar uma demonstração gratuita.
Cópia para análise (versão PC) cedida pela Kwalee.