O primeiro novo jogo da Bethesda Games Studios em mais de duas décadas é também o maior da produtora. Mas no meio de tanta ambição e de espaço vazio, são as pequenas histórias e a descoberta de novas possibilidades que tudo fazem para nos manter investidos.
Starfield não é o jogo de exploração espacial que muitos de nós julgávamos que poderia vir a ser. Na verdade, nós próprios – a comunidade de jogadores -, fomos traídos pelas nossas próprias expectativas, por ideias e conceitos que, na realidade, sempre foram claros durante as apresentações da Bethesda.
“Starfield é o nosso primeiro novo universo em mais de 25 anos. Mas ainda é um RPG da Bethesda por completo.”, disse Todd Howard durante a transmissão da Starfield Direct.
Starfield não é a versão da Bethesda Game Studios de No Man’s Sky ou de Star Citizen, apesar de reconhecer as suas semelhanças. Não se foca inteiramente na exploração e investigação planetária que associamos aos jogos deste género. Tão pouco é um jogo de “mundo aberto” convencional, como a própria produtora nos trouxe no passado. Starfield é mais fragmentado, modular conceptualmente em execução, recheado de oportunidades para nos manter investidos, mesmo quando o seu conteúdo parece, numa primeira impressão, limitador. Diria até que, quando Starfield “desbloqueia”, todos os seus constrangimentos existentes por decisões de design são uma lufada de ar fresco, que nos guiam na exploração das suas histórias. Algumas com guião, escritas pela produtora, mas muitas mais por nós, jogadores, ao escolhermos fugir dos objetivos em busca de algo maior.
A minha aventura em Starfield marcou exatamente 72 horas no final da sua Main Quest, que decidi fazê-la ainda com imensas histórias e missões “secundárias” pendentes, guiado pela pressão pessoal de descobrir o que é que o tão gabado New Game Plus me aguardava. Sem explicar o que realmente é, mas confirmando que é algo de muito especial, sinto que terá um peso diferente para quem investir tempo e energia na sua primeira jornada por Starfield, consumido o máximo de histórias que conseguir até se sentir satisfeito. E sem pressas. Isto porque Starfield, dentro da sua fragmentação, é uma coleção de histórias e de aventuras, com várias campanhas associadas a diferentes fações e personagens secundárias que, na minha modesta opinião, são muito mais interessantes e muito mais bem executadas que os mistérios do Universo que vamos descobrindo na sua missão principal.
Para quem já jogou jogos da Bethesda no passado, sentir-se-á realmente familiarizado com Starfield, que, apesar das suas falhas e duras críticas de uma franja de jogadores mais cínicos, apresenta um salto gigante em melhorias de qualidade de vida da experiência, um nível de acabamento e de polimento surpreendentemente alto, mas, para mim (que nunca fui o maior fã dos jogos da produtora), um excelente nível de foco para quem quiser seguir as histórias pelo carreirinho das formigas.
Se o excesso de conversas, de ecrãs de menus e inventários, indicadores de navegação e outras notificações vos causam alergias, então vão passar um mal bocado com Starfield. Grande parte do tempo resolve-se em diálogos conceptualmente dinâmicos, onde sentimos o peso e as consequências de quase todas as nossas escolhas, mas rígidos em execução, com planos estáticos das personagens a fazerem um rastreio da nossa alma de olhos fixos na nossa direção. Outra grande parte do tempo é passada em menus, que admito que numa primeira impressão são intimidantes, mas que rapidamente se tornam bastante simples de navegar e de ler. E uma outra parte acontece em tempos de carregamento.
A questão dos tempos de carregamento em mais de metade das nossas ações torna-se bem mais irritante especialmente quando pensamos e refletimos sobre os mesmos. Ou quando se torna o nosso foco subconsciente, como aconteceu, por exemplo, quando tentava mostrar o jogo a alguém e antes de acontecer algo interessante. São carregamentos de meros segundos, que podem ser justificados por questões técnicas de carregamento de níveis e de ambientes, mas que ,no ponto de vista de um jogador alheio a esse ângulo, compreende-se bastante bem a crítica desta execução.
É verdade que Fallout 76 deixou muita amargura e destruiu quase por completo a reputação da Bethesda Game Studios. O que, no passado, eram coisas engraçadas que aconteciam ocasionalmente nos seus videojogos, tornaram-se numa obsessão pelos jogadores mais críticos, alterando por completo a postura de praticamente todos os consumidores, que agora vêm algo fora do sitio e declaram o “pior jogo de sempre”. Falo, pois, dos bugs e glitches.
Starfield, por muito polido que seja, não se poupa de problemas, de uma otimização questionável devido aos acordos exclusivos com fabricantes de hardware e de decisões de design. Mas ainda assim, não consigo não amar este jogo.
Como já dei a entender, não fiquei fã da sua história principal, mas todas as campanhas secundárias, dedicadas às várias fações, fizeram-me viver fantasias espaciais singulares, intrigantes e pessoais, cuja escrita de algumas dava o seu próprio filme ou série de televisão premium. Como a questline em que ao longo de várias missões somos infiltrados numa fação pirata, ou questline em que temos que investigar a ascensão de uma raça de monstros que pode por em causa o futuro das colónias humanas.
E depois temos todas as interações e missões espalhadas pela galáxia que podemos ou não tropeçar nelas durante a nossa exploração, como a avozinha na sua nave que nos convida para um lanche, ou uma nave de colonos pré-expansão espacial à deriva no espaço há 200 anos, que nos abre mais uma série de missões.
Pequenos momentos destes incentivam-nos a um nível de exploração muito peculiar e a quebrar as narrativas principais fixas. O jogo começa a questionar-nos, sem nos dizer diretamente, para onde ir. Há muitos planetas vazios e desertos? Então porque não fazer scan e procurar planetas com fauna e flora? Quem sabe não encontramos um planeta cheio de dinossauros e insetos gigantes que se juntam às manadas para nos perseguir? Porque isso foi algo que realmente me aconteceu!
Mais do que as suas missões principais, eventos destes e as sucessivas surpresas mecânicas que o jogo me ia apresentando fizeram-me ficar completamente vidrado em Starfield durante os últimos dias. Para não mencionar o quão divertido e viciante também é podermos construir e personalizar as nossas naves, como se fossem sets de LEGO, para as fotografar posteriormente em planetas mais exóticos.
Starfield é primeiro novo jogo da Bethesda Games Studios em mais de duas décadas é também o maior da produtora. Mas no meio de tanta ambição e de espaço vazio, são as pequenas histórias e a descoberta de novas possibilidades que tudo fazem para nos manter investidos. 72 duas horas depois, posso prever que vou adicionar mais uma centena delas até sentir fadiga. Porque após a minha primeira aventura em Starfield, comprovo que tem sido dito é mesmo verdade, o fim é apenas o início do jogo.
Cópia para análise cedida pela Ecoplay.